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CAPÍTULO SEIS

Blaine Hildreth sentiu uma série de emoções contraditórias ao atravessar a multidão. Tinha visto Riley quando ela se levantara para aplaudir. Parecera-lhe tão vital e impressionante como sempre, e Blaine não se conteve indo ao seu encontro. Agora ela olhava para ele à medida que ele se aproximava, mas ele não conseguia ler a sua expressão.

Como se sentira por vê-lo?

E como é que ele se sentira por vê-la novamente?

Blaine não conseguiu evitar recuar a um dia traumático ocorrido há mais de dois meses…

Ele estava sentado na sua própria sala de estar quando ouviu u barulho ensurdecedor vindo da porta ao lado.

Foi a casa de Riley e viu que a porta estava parcialmente aberta.

Entrou e viu o que se estava a passar.

Um homem estava a atacar April, a filha de Riley. O homem tinha atirado April ao chão e ela contorcia-se, batendo-lhe com os punhos.

Blaine interviu e afastou o atacante de April. Lutou com o homem, tentando subjugá-lo.

Blaine era ais alto do que o atacante, mas não era mais forte, nem mais ágil.

Continuou a tentar atingir o homem, mas a maioria das suas tentativas falharam e as que acertava parecia não causar qualquer impacto.

De repente, o homem deu um golpe no abdómen de Blaine que ficou imediatamente sem ar. Debruçou-se não conseguindo respirar.

Depois o atacante deu-lhe um pontapé no rosto…

… e tudo ficou negro.

Dali para a frente Blaine só se lembra de estar no hospital.

E agora, ao aproximar-se de Riley, Blaine estremecia um pouco ante aquela memória.

Tentou acalmar-se.

Quando alcançou Riley, não sabia o que fazer. Apertar as mãos parecia um pouco ridículo. Deveria abraçá-la?

Blaine viu que o rosto de Riley estava enrubescido com a vergonha. Também ela parecia não saber o que fazer.

“Olá Blaine,” Disse Riley.

“Olá.”

Ficaram ali a olhar um para o outro durante alguns instantes, depois riram do seu próprio embaraço.

“As nossas miúdas estão a jogar bem,” Disse Riley.

“Sobretudo a tua,” Disse Blaine.

O golo de April tinha impressionado Blaine.

“Estás aqui com alguém?” Perguntou Riley.

“Não. E tu?”

“Só com a Jilly,” Disse Riley. “Penso que não a conheces. A Jilly é… bem, é uma longa história.”

Blaine fez um gesto de assentimento com a cabeça.

“Já sei da Jilly pela minha filha,” Disse ele. “Adotá-la é fantástico.”

Blaine lembrou-se de mais uma coisa que a Crystal lhe dissera. Riley estava a tentar entender-se novamente com Ryan. Blaine interrogou-se como é que isso estaria a correr. O Ryan não estava ali no jogo.

Algo timidamente, Riley disse, “Ouve, estamos sentadas nas últimas bancadas. Temos algum espaço extra. Queres ver o resto do jogo connosco?”

Blaine sorriu.

“Gostaria muito,” Disse ele.

Atravessaram a multidão e subiram para as bancadas. Uma rapariguinha magra sorriu quando viu Riley aproximar-se, mas não pareceu satisfeita quando reparou que Blaine estava com ela.

“Jilly, este é o meu amigo Blaine,” Disse Riley.

Sem dizer uma palavra, Jilly levantou-se e começou a afastar-se.

“Senta-te perto de nós, Jilly,” Disse Riley.

“Vou para junto dos meus amigos,” Disse Jilly, passando por eles e continuando a descer as escadas. “Ainda tenho espaço perto deles.”

Riley parecia chocada e desanimada.

“Peço desculpa,” Disse ela a Blaine. “Aquilo foi inqualificável.”

“Não faz mal,” Disse Blaine.

Riley suspirou quando ambos se sentaram.

“Não, faz mal sim senhor,” Disse ela. “Há muitas coisas que estão mal. A Jilly está zangada porque estou sentada ao lado de alguém que não é o Ryan. Ele tinha-se mudado lá para casa e ela afeiçoou-se muito a ele.”

Riley abanou a cabeça.

“Agora o Ryan está a sair de casa,” Disse ela. “Ainda não tive a oportunidade de dizer nada às miúdas. Ou ainda não tive a coragem. Vão ficar muito sentidas.”

Blaine sentiu-se u pouco aliviado por Ryan já estar fora de cena. Ele tinha visto o ex-marido de Riley algumas vezes e a arrogância do homem deixara-o fora de si. Para além disso, tinha que o admitir, esperava que Riley não tivesse nenhum relacionamento em curso.

Mas também se sentiu culpado por reagir dessa forma.

O jogo entretanto recomeçara. Tanto April coo Crystal estavam a jogar bem, e Blaine e Riley aplaudiam de vez em quando.

Mas Blaine não conseguia parar de pensar na última vez que vira Riley. Fora pouco depois de regressar do hospital. Batera-lhe à porta para lhe dizer que ele e Crystal se iam mudar. Blaine tinha dado a Riley uma desculpa esfarrapada. Dissera-lhe que a casa ficava muito longe do restaurante.

Também tentara dar a sensação de que a mudança não era nada de especial.

“Será como se nada tivesse mudado,” Dissera-lhe ele.

É claro que não era verdade e Riley sabia-o.

Riley ficara claramente desagradada.

Aquele parecia um momento tão bom como qualquer outro para falar no assunto.

Co uma voz hesitante, Blaine disse, “Ouve Riley, peço desculpa de como as coisas correram da última vez que nos vimos. Quando te disse que nos íamos mudar. Não estava muito bem.”

“Não é preciso explicares nada,” Disse Riley.

Mas Blaine sentia as coisas de forma diferente.

Disse, “Ouve, penso que ambos conhecemos a razão pela qual eu e a Crystal nos mudámos.”

Riley encolheu os ombros.

“Pois,” Disse Riley. “Receaste pela segurança da tua filha. Não te censuro Blaine. A sério que não. Apenas estavas a ser sensível.”

Blaine não sabia o que dizer. É claro que Riley tinha razão. Ele temera pela segurança de Crystal, não pela sua. E também queria zelar pelo bem-estar mental de Crystal. A ex-mulher de Blaine, Phoebe, era uma alcoólica violenta e a Crystal ainda estava a lidar com as cicatrizes emocionais dessa relação. Não precisava de mais traumas na sua vida.

Riley tinha conhecimento das ações de Phoebe. Na verdade, ela tinha salvo Crystal de uma das fúrias alcoólicas de Phoebe.

Talvez ela realmente compreenda, Pensou ele.

Mas não podia saber o que é que ela realmente sentia.

E naquele preciso momento, a equipa das filhas marcou outro golo. Blaine e Riley aplaudiram. Assistiram ao jogo em silêncio durante alguns instantes.

Depois Riley disse,”Blaine, eu admito que fiquei desiludida contigo quando te mudaste. Talvez até tenha ficado um pouco zangada. Estava errada. Não foi justo da minha parte. Peço desculpa pelo que aconteceu.”

Ela parou de falar por um momento e depois prosseguiu.

“Senti-me muito mal com o que te aconteceu. E culpada. Ainda me sinto assim. Blaine, eu…”

Durante um momento, ela parecia estar a lutar com os seus pensamentos e sentimentos.

“Não consigo evitar pensar que trago perigo a todos os que se atravessam no meu caminho. Odeio isso no meu trabalho. Odeio isso em mim.”

Blaine começou a objetar.

“Riley, não podes…”

Riley impediu-o.

“É verdade e ambos o sabemos. Se eu fosse minha vizinha, eu também ia querer mudar. Pelo menos enquanto tivesse uma adolescente a meu cargo.”

Naquele momento, uma jogada correu mal para a equipa das suas filhas. Blaine e Riley protestaram juntamente com a multidão que apoiava a equipa da casa.

Blaine começava a sentir-se algo tranquilizado. Riley já não o levava a mal por ter tomado a decisão que tomara.

Seria possível reacenderem o interesse que haviam tido um pelo outro?

Blaine ganhou coragem e disse, “Riley, queria convidar-te e às tuas filhas para jantarem no meu restaurante. Também podes trazer a Gabriela. Eu e ela podemos falar de receitas da América Central.”

Riley ficou muito sossegada durante alguns segundos. Parecia que não tinha ouvido o que Blaine dissera.

Por fim disse, “Não me parece Blaine. As coisas estão demasiado complicadas neste momento. Mas obrigada pelo convite.”

Blaine não conseguiu evitar sentir-se desiludido. Riley estava não só a rejeitá-lo, como parecia não deixar em aberto quaisquer possibilidades futuras.

Mas nada podia fazer quanto a isso.

Assistiu ao resto do jogo com Riley em silêncio.

*

Riley ainda estava a pensar em Blaine enquanto jantava nessa noite. Perguntava-se se tinha cometido um erro. Talvez devesse ter aceite o seu convite. Ela gostava dele e tinha saudades.

Até tinha convidado Gabriela, o que era uma atitude muito querida. Ele tinha apreciado a comida de Gabriela no passado.

E Gabriela tinha preparado para aquela noite uma deliciosa refeição Guatemalteca – galinha com molho de cebola. As miúdas estavam a apreciar a refeição e a conversar sobre a vitória no futebol naquela tarde.

“Porque é que não vieste ao jogo Gabriela?” Perguntou April.

“Havias de ter gostado,” Disse Jilly.

“Sí, eu gosto de futbol.” Disse Gabriela. “Vou numa próxima oportunidade.”

Aquela parecia uma boa altura para Riley dar uma notícia.

“Tenho boas notícias,” Disse ela. “Falei com a minha corretora de imóveis hoje e ela pensa que a venda da cabana do avô pode render bastante. Pode ajudar muito para a faculdade – de ambas.”

As miúdas ficaram agradadas e conversaram sobre o assunto durante algum tempo. Mas passado pouco tempo a disposição de Jilly pareceu ensombrecer.

Por fim, Jilly perguntou a Riley, “Quem era aquele homem que estava no jogo contigo?”

April disse, “Oh, era o Blaine. Foi nosso vizinho. É o pai da Crystal. Já a conheceste.”

Jilly comeu em silêncio durante alguns instantes.

Depois disse, “Onde está o Ryan? Porque é que ele não foi ao jogo?”

Riley engoliu em seco. Ela já notara que Ryan tinha ido lá a casa durante o dia para levar as suas coisas. Chegara o momento de dizer a verdade às miúdas.

“Há uma coisa que quero dizer a todas vocês,” Começou.

Mas teve dificuldades em encontrar as palavras certas.

“O Ryan… diz que precisa de espaço. Ele….”

Não foi capaz de dizer mais nada. Percebeu pelos rostos das miúdas que não precisava. Compreenderam perfeitamente o que ela queria dizer.

Depois de alguns segundos de silêncio, Jilly desatou a chorar e saiu da mesa, correndo escadas acima. April seguiu-a para a consolar.

Riley percebeu que April estava acostumada aos desequilíbrios de Ryan. Estas desilusões ainda deviam doer, mas ela conseguia lidar com elas melhor do que Jilly.

Sentada à mesa apenas com Gabriela, Riley começou a sentir-se culpada. Seria ela completamente incapaz de manter uma relação séria com um homem?

Como se tivesse lido os seus pensamentos, Gabriela disse, “Pare de se culpar. A culpa não é sua. Ryan é um pateta.”

Riley sorriu tristemente.

“Obrigada Gabriela,” Disse ela.

Era precisamente aquilo que ela precisava de ouvir.

Depois Gabriela acrescentou, “As miúdas precisam de uma figura de pai, mas não de alguém que vai e vem daquela forma.”

“Eu sei,” Disse Riley.

*

Mais tarde nessa noite, Riley foi ver como estavam as miúdas. Jilly estava no quarto de April, a fazer os trabalhos de casa em silêncio.

April olhou para cima e disse, “Nós estamos bem mãe.”

Riley sentiu-se aliviada. Por muito triste que se sentisse pelas filhas, estava orgulhosa por April estar a confortar Jilly.

“Obrigada querida,” Disse ela e fechou a porta silenciosamente.

Pensou que April falaria com ela sobre Ryan quando se sentisse preparada. Mas para a Jilly podia ser mais complicado.

Ao descer as escadas, Riley deu por si a pensar no que Gabriela tinha dito.

“As miúdas precisam de uma figura de pai.”

Olhou para o telefone. Blaine tornara claro que queria retomar a sua relação.

Mas o que esperaria ele dela? A sua vida resumia-se às miúdas e ao trabalho. Poderia ela incluir mais alguém nela naquele momento? Será que o iria apenas desiludir?

Mas, Admitiu ela, Eu gosto dele.

E era óbvio que ele gostava dela. Na vida devia haver lugar para…

Pegou no telefone e ligou o número da casa de Blaine. Ficou desapontada ao ser recebida pelo atendedor de chamadas, mas não surpreendida. Ela sabia que o seu trabalho no restaurante muitas vezes o mantinha fora de casa à noite.

Ao sinal, Riley deixou uma mensagem.

“Olá Blaine. É a Riley. Ouve, desculpa se agi de forma um pouco distante no jogo desta tarde. Só quero dizer que se o teu convite de jantar se mantiver, podes contar connosco. Liga-me quando puderes para combinarmos.”

Riley sentiu-se imediatamente melhor. Foi para a cozinha e serviu-se de uma bebida. Ao sentar-se no sofá da sala, lembrou-se da conversa que tivera com Paula Steen.

Paula parecia estar em paz com o facto de o assassino da filha nunca vir a ser julgado.

“Não é culpa de ninguém e eu não culpo ninguém,” Dissera Paula.

Essas palavras agora perturbavam Riley.

Parecia tão injusto.

Riley terminou a sua bebida, tomou um banho e foi para a cama.

Mal tinha adormecido quando os pesadelos começaram,

*

Riley era apenas uma menina.

Atravessava um bosque de noite. Tinha medo, mas não sabia muito bem porquê.

Afinal, ela não estava propriamente perdida no bosque.

O bosque fica perto de uma autoestrada e ela conseguia ver carros a passar. O brilho de um poste de iluminação e a lua cheia iluminavam o seu caminho entre as árvores.

Então os seus olhos pousaram numa fila de três campas rasas.

A terra e pedras que cobriam as campas eram instáveis.

Mãos de mulheres irrompiam das campas.

Ela conseguia ouvir as suas vozes abafadas dizer…

“Ajuda-nos! Por favor!”

“Mas eu sou apenas uma menina!” Respondia Riley chorosa.

Riley acordou a tremer.

É só um pesadelo, Disse a si mesma.

E não era propriamente surpreendente que tivesse sonhado com as vítimas do assassino da caixa de fósforos na noite a seguir a ter falado com Paula Steen.

Respirou profundamente. Passado pouco tempo sentiu-se novamente descontraída e voltou a adormecer.

Mas então…

Ela era apenas uma menina.

Estava numa loja de doces com a mãe e a mãe estava a comprar-lhe muitos doces.

Um homem assustador com uma meia na cabeça veio na sua direção.

Apontou uma arma à mãe.

“Dê-me o seu dinheiro,” Disse à mãe.

Mas a mãe estava demasiado amedrontada para se conseguir mexer.

O homem disparou contra o peito da mãe e ela caiu mesmo em frente a Riley.

Riley começou a gritar. Virou-se à procura de alguém que pudesse ajudar.

Mas de repente, estava novamente no bosque.

As mãos das mulheres ainda remexiam nas campas.

As vozes ainda zurziam…

“Ajuda-nos! Por favor!”

Então Riley ouviu outra voz a seu lado. Uma voz familiar…

“Ouviste-as Riley. Elas precisam da tua ajuda.”

Riley virou-se e viu a mãe. O peito sangrava do disparo e o rosto tinha uma palidez mortal.

“Não as posso ajudar mãe!” Declarou Riley. “Eu sou só uma menina!”

A mãe sorriu.

“Não, não és só uma menina Riley. Já és adulta. Vira-te e vê.”

Riley virou-se e viu-se a fitar um espelho de corpo inteiro.

Era verdade.

Agora ela era uma mulher.

E as vozes ainda a chamavam…

“Ajuda-nos! Por favor!”

Os olhos de Riley abriram-se novamente.

Tremia mais do que da outra vez e tinha dificuldades em respirar.

Lembrava-se de algo que Paula Steen lhe tinha dito.

“O assassino da minha filha nunca será julgado.”

E Paula também tinha dito…

“O caso nunca foi seu.”

Riley sentiu invadir-se por uma nova sensação de determinação.

Era verdade – o assassino da caixa de fósforos não fora um caso seu.

Mas não o podia deixar esquecido no passado.

O assassino da caixa de fósforos tinha que ser finalmente apanhado.

Agora o caso é meu, Pensou.

CAPÍTULO SETE

Riley não teve mais pesadelos nessa noite, mas ainda assim o seu sono foi inquieto. De forma surpreendente, na manhã seguinte acordou cheia de energia.

Tinha trabalho a fazer nesse dia.

Vestiu-se e desceu as escadas. April e Jilly estavam na cozinha a tomar o pequeno-almoço que Gabriela lhes preparara. Ambas as raparigas pareciam estar tristes, mas não tão tristonhas como no dia anterior.

Riley viu que fora colocado um lugar na mesa para ela, por isso sentou-se e disse, “Essas panquecas estão com ótimo aspeto. Passem-mas, se faz favor.”

Enquanto tomava o pequeno-almoço e bebia o café, as miúdas começaram a parecer mais alegres. Não mencionaram a ausência de Ryan e, em vez disso, conversavam sobre outros miúdos da escola.

São resistentes, Pensou Riley.

E ambas tinham passado por momentos difíceis no passado.

Riley tinha a certeza de que também ultrapassariam aquela crise relacionada com Ryan.

Riley terminou o seu café e disse, “Tenho que ir para o meu gabinete.”

Levantou-se e deu um beijo na bochecha de April e de Jilly.

“Força em apanhar gente má, mãe,” Disse Jilly.

Riley sorriu.

“Podes crer que é isso mesmo que vou fazer,” Respondeu.

*

Assim que chegou ao gabinete, Riley abriu ficheiros no computador sobre o caso de há vinte e cinco anos. Ao aceder a velhas histórias de jornais, lembrou-se de ler algumas delas nessa altura. Era adolescente nesse tempo e o assassino da caixa de fósforos era uma história de pesadelo.

Os homicídios tinham acontecido em Virginia perto de Richmond com um intervalo de apenas três semanas entre cada morte.

Riley abriu um mapa e descobriu Greybull, uma pequena cidade à saída da Interestadual 64. Tilda Steen, a última vítima, vivera e morrera em Greybull. Os outros dois homicídios tinham ocorrido nas cidades de Brinkley e Denison. Riley conseguia ver que as cidades distavam cerca de cento e sessenta quilómetros umas das outras.

Riley fechou o mapa e debruçou-se novamente nas histórias de jornal.

Um cabeçalho se destacava…

ASSASSINO DA CAIXA DE FÓSFOROS ATACA TERCEIRA VÍTIMA!

Estremeceu um pouco.

Sim, ela recordava-se de ver aquele cabeçalho há muitos anos atrás.

O artigo descrevia o pânico que os crimes haviam despoletado na área – sobretudo entre mulheres jovens.

De acordo com o artigo, o público e a polícia perguntavam ambos o mesmo:

Quando e onde é que o assassino vai atacar novamente?

Quem vai ser a sua próxima vítima?

Mas não houvera uma quarta vítima.

Porquê? Perguntava-se Riley.

Tratava-se de uma pergunta que à qual as autoridades não tinham conseguido responder.

O assassino parecia ser um assassino em série impiedosamente motivado – o género que continuaria a matar até ser apanhado. Mas em vez disso, ele tinha simplesmente desaparecido e o seu desaparecimento tinha sido tão misterioso como os próprios crimes.

Riley começou a rever velhos registos policiais para refrescar a memória.

As vítimas não pareciam ter qualquer ligação entre si. O assassino usara o mesmo MO nos três homicídios. Engatara as jovens mulheres em bares, levou-as para motéis e matou-as. Depois enterrou os corpos em campas rasas não muito longe dos locais onde tinha cometido os crimes.

A polícia local tinha tido dificuldades em localizar os bares onde as vítimas tinham sido engatadas e os motéis onde tinham sido assassinadas.

Tal como acontece com alguns assassinos em série, ele deixara pistas para a polícia.

Tinha deixado em todos os corpos, caixas de fósforos dos bares e papel de carta dos motéis.

As testemunhas nos bares e motéis mal conseguiam dar uma descrição do suspeito.

Riley olhou para o esboço traçado há tantos anos.

Viu que o homem parecia bastante normal com cabelo castanho escuro e olhos cor de avelã. Ao ler descrições de testemunhas, reparou em mais alguns detalhes. As testemunhas tinham referido que ele parecia extraordinariamente pálido, como se trabalhasse num local que o mantivesse dentro de portas e afastado do sol.

As descrições não eram muito detalhadas. Ainda assim, parecia a Riley que o caso não deveria ter sido tão difícil de resolver. Mas fora. A polícia local nunca descobrira o assassino. A UAC tomou conta do caso apenas para concluir que o assassino ou tinha morrido ou tinha abandonado a região. Continuar as buscas a nível nacional, seria como procurar uma agulha num palheiro – uma agulha que podia nem sequer existir.

Mas houvera um agente, um mestre em resolver casos antigos que discordara.

“Ele ainda está na região,” Dissera ele a todos. “Conseguimos encontra-lo se continuarmos a procurar.”

Mas os chefes não seguiram o seu conselho e não o apoiaram. A UAC deixara o caso cair no esquecimento.

Aquele agente aposentara-se da UAC há vários anos e mudara-se para a Flórida. Mas Riley sabia como entrar em contacto com ele.

Pegou no seu telefone e ligou o seu número.

Um momento mais tarde, Riley ouviu uma voz familiar. Jake Crivaro fora seu parceiro e mentor quando ela entrou na UAC.

“Olá desaparecida,” Disse Jake. “Por onde andaste? Que tens feito? Não ligas, não escreves. Isso é forma de se tratar um velho solitário que te ensinou tudo o que sabes?”

Riley sorriu. Ela sabia que ele só estava a brincar. No final de contas, tinham-se visto há bem pouco tempo. Jake até a tinha ajudado num caso há poucos meses atrás.

Ela não perguntou, “Como tens passado?”

Lembrou-se do que ele dissera da última vez que ela perguntara.

“Tenho setenta e cinco anos. Fui operado aos joelhos e à anca. Os meus olhos estão uma miséria. Tenho um aparelho auditivo e um pacemaker. E todos os meus amigos, exceto tu, bateram as botas. Como é que achas que estou?”

Perguntar-lhe apenas o faria queixar-se novamente.

A verdade era que ele ainda estava apto fisicamente e a sua mente estava mais desperta que nunca.

“Preciso da tua ajuda Jake,” Disse Riley.

“Isso é música para os meus ouvidos. Estar aposentado é uma treta. Em que te posso ajudar?”

“Estou a espreitar um caso antigo.”

Jake riu-se.

“Os meus favoritos. Sabes, os casos antigos eram uma especialidade minha. Ainda são uma espécie de hobby. Mesmo na reforma, posso recolher e rever coisas que ninguém conseguiu resolver. Lembras-te daquele assassino apelidado de ‘rosto de anjo’ no Ohio? Resolvi esse há alguns anos. Estava na prateleira há mais de uma década.”

“Eu lembro-me,” Disse Riley. “Isso foi um excelente trabalho para alguém já fora do ativo.”

“A lisonja leva-te a qualquer lado. Então, o que é que tens para mim?”

Riley hesitou. Ela sabia que estava prestes a mexer com memórias desagradáveis.

“Este caso foi um dos teus, Jake,” Disse ela.

Jake manteve-se em silêncio durante alguns segundos.

“Não me digas,” Disse ele por fim. “O caso do assassino da caixa de fósforos.”

Riley quase perguntou, “Como é que sabes?”

Mas era fácil adivinhar a resposta.

Jake vivia obcecado com falhas do passado, sobretudo as suas. Sem dúvida que tinha conhecimento do aniversário da morte de Tilda Steen. O mais certo era também saber o aniversário das mortes das outras vítimas. Riley calculou que fosse algo que o atormentasse todos os anos.

“Isso foi antes do teu tempo,” Disse Jake. “Porque é que queres remexer outra vez nessa velha história?”

Riley sentiu amargura na sua voz – a mesma amargura que se lembrava de lhe ouvir quando ainda era uma jovem novata. Ele ficara furioso com os superiores por encerrarem o caso. E nunca deixara de ter esse sentimento, mesmo quando se aposentou.

“Sabes que tenho contactado a mãe de Tilda Steen ao longo dos anos,” Disse Riley. “Falei com ela ontem. Desta vez…”

Fez uma pausa. Como o poderia dizer?

“Acho que me impressionou mais do que o habitual. Se ninguém fizer nada, aquela pobre mulher vai morrer sem ver o assassino da filha ser julgado. Não tenho outros casos de momento e eu…”

A sua voz esmoreceu.

“Sei bem como te sentes,” Disse Jake num tom de compreensão. “Aquelas três mulheres mortas merecem mais. As suas famílias merecem mais.”

Riley sentiu-se aliviada por Jake partilhar os seus sentimentos.

“Não posso fazer muito sem o apoio da UAC,” Disse Riley. “Achas que haverá forma de reabrir o caso?”

“Não sei. Talvez. Vamos começar já a trabalhar.”

Riley conseguia ouvir os dedos de Jake a percorrerem o teclado do computador em busca dos seus ficheiros.

“O que é que correu mal quando trabalhaste no caso?” Perguntou Riley.

“O que é que não correu mal? As minhas teorias não tiveram bom acolhimento na UAC. A região era rural na altura, apenas três pequenas cidades. Mesmo assim, ao longo de uma Interestadual tão próxima de Richmond, havia inúmeras variáveis. O FBI decidiu que devia tratar-se de alguém de passagem que desaparecera. Mas o meu instinto dizia-me algo diferente – que ele vivia na região e que ainda lá devia viver. Mas ninguém quis saber do que o meu instinto indicava.”

Enquanto digitava, resmungava, “Podia ter resolvido isto há anos se não fosse o meu parceiro merdoso.”

Riley já tinha ouvido falar no parceiro incompetente de Jake que tinha sido despedido antes de Riley entrar na UAC.

Ela disse, “Ouvi dizer que lixou quase tudo em que tocou.”

“Sim, literalmente. Num dos bares, manuseou um copo em que o assassino tinha tocado esfregando as impressões digitais.”

“Não havia impressões digitais nos guardanapos ou nas caixas de fósforos?”

“Não depois de estarem cobertos de terra numa campa rasa. O tipo estragou tudo. Devia ter sido logo despedido. Mas não durou muito. Da última vez que soube, trabalhava numa loja de conveniência. Excelente escolha.”

Jake parou de teclar. Riley calculou que agora tivesse todo o material à mão.

“OK, agora fecha os olhos,” Disse Jake.

Riley fechou os olhos e sorriu. Ele ia sujeitá-la ao mesmo exercício que ela ensinara aos seus alunos. Fora com ele que Riley o aprendera.

Jake disse, “Tu és o assassino, mas ainda não mataste ninguém. Entraste no Pub McLaughlin’s em Brinkley e acabaste de te apresentar a uma rapariga chamada Melody Yanovich. Deste a entender que estavas interessado nela e as coisas parecem estar a correr bem.”

Ela começou a ver as coisas sob o ponto de vista do assassino. A cena decorria claramente na sua cabeça.

Jake disse, “Há uma pequena taça de caixas de fósforos no bar. A meio do teu engate, pegas numa e coloca-la no bolso. Porquê?”

Riley conseguia praticamente sentir a pequena caixa de fósforos entre os seus dedos. Imaginou-se a coloca-la no bolso da camisa.

Mas porquê? Perguntou-se.

Quando o caso fora aberto, havia uma teoria de senso comum a esse respeito. O assassino deixara as caixas de fósforos dos bares e o papel de carta dos motéis nos corpos das vítimas para brincar com a polícia.

Mas agora ela percebeu – Jake não pensava dessa forma.

E agora ela também não.

Riley disse, “Ele nem sabia que ia matá-la – pelo menos não quando estava no Pub McLaughlin’s, não daquela primeira vez. Ele pegou na caixa de fósforos como recordação da sua iminente conquista, um troféu pelos bons momentos que esperava passar.”

“Isso,” Disse Jake. “E depois?”

Riley conseguia visualizar claramente o assassino a ajudar Melody Yanovich a sair do carro e a acompanhá-la ao quarto de motel.

“A Melody estava disposta e ele sentia-se confiante. Mal entraram no quarto, ela foi para a casa de banho preparar-se. Entretanto, ele pegou num pedaço de papel com o logótipo do hotel – pela mesma razão porque pegara na caixa de fósforos, como recordação. Depois tirou a roupa e enfiou-se debaixo dos lençóis. Melody saiu da casa de banho…”

Riley parou para visualizar a cena de forma mais vívida.

A mulher estava nua nessa altura?

Não, não exatamente, Pensou Riley.

“Melody saiu com uma toalha embrulhada à sua volta. Nesse momento ele começou a sentir-se desconfortável. Já tivera problemas sexuais no passado. Também os teria desta vez? Ela entrou na cama e retirou a toalha e…”

“E?” Perguntou Jake.

“E soube de imediato – que não o conseguiria fazer. Estava envergonhado e humilhado. Não podia deixar a mulher escapar sabendo que ele tinha falhado. Uma fúria colossal apoderou-se dele. A sua fúria despojou-o da sua humanidade. Agarrou nela pela garganta e estrangulou-a na cama. Ela morreu muito rapidamente. A sua raiva atenuou-se e ele percebeu o que fizera e sentiu-se culpado. E…”

A mente de Riley voltou ao crime. O assassino tinha não só enterrado as vítimas em campas rasas, como o fizera junto a ruas e autoestradas. Ele sabia perfeitamente bem que os corpos seriam encontrados. Na verdade, ele certificara-se de que seriam encontrados.

Os olhos de Riley abriram-se.

“Já percebi Jake. Quando ele pegou nas caixas de fósforos e pedaços de papel pela primeira vez, ele só queria recordações. Mas depois dos crimes, usou-os para algo diferente. Deixou-os com os corpos para ajudar a polícia, não para brincar. Ele queria ser apanhado. Não tinha a coragem de se entregar, então deixava pistas.”

“Estás a chegar lá,” Disse Jake. “Eu penso os dois primeiros crimes funcionaram dessa forma. Agora olha para o resumo que a polícia local fez dos crimes.”

Riley olhou para o relatório que tinha no seu computador.

“Porque é que o último crime foi diferente?” Perguntou Jake.

Riley leu o texto. Não reparou em nada que ainda não soubesse.

“Tilda Steen estava vestida quando ele a enterrou. Parecia que não tinha sequer tentado ter relações sexuais com ela.”

Jake disse, “Agora diz-me o que aí está como causa de morte das três vítimas.”

Riley encontrou o que procurava rapidamente.

“Estrangulamento,” Disse ela. “Igual para as três.”

Jake resmoneou desanimado.

“Foi aí que a polícia local errou,” Disse ele. “As duas primeiras, Melody Yanovich e Portia Quinn foram sem dúvida estranguladas. Mas eu descobri pelo médico-legista – não havia nódoas negras no pescoço de Tilda Steen. Fora sufocada, mas não estrangulada. O que é que isto te diz?”

O cérebro de Riley começou a processar aquela nova informação.

Fechou os olhos novamente, tentando imaginar a cena.

“Algo aconteceu quando ele levou Tilda para aquele quarto de motel,” Disse Riley. “Ela confiou-lhe alguma coisa, talvez algo que nunca tinha dito a ninguém. Ou talvez ele lhe tenha dito algo a seu respeito que ela quisesse saber. Subitamente ela tornou-se…”

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