Kitabı oku: «Flores do Campo», sayfa 6
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A VICTORIA COLONNA
Não sei que ha de divino, força é crêl-o
N’esses teus olhos d’uma luz tão pura
Que, ao vêl-os, tive logo por segura
Aquella paz que é meu constante anhelo.
Filha de Deus, nossa alma aspira a vêl-o;
Desprezando caduca formosura,
Ella, em seu giro eterno, só procura
A fórma, o typo universal do bello.
Não póde amar, não deve, uma alma casta
Fugaz belleza, graça transitoria,
Coisa que o tempo leva, o tempo gasta.
Nem tambem alma digna de memoria
Póde amar o prazer, que o bruto arrasta,
Em vez do puro amor— sombra da gloria.
Miguel-Angelo.
Coimbra.
N’UM CONVENTO
Como a agua em funda gruta
Gotta a gotta filtra e cái,
Sem saber quem isso escuta
O que lá por dentro vai:
Como ao longe incerta e baça
N’uma igreja alveja a luz,
Que da lampada esvoaça
E a vidraça reproduz:
Mal te vi, moira encantada!
Mas á luz dos olhos teus
Murcha a lampada sagrada
D’um altar do nosso Deus.
Mal te ouvi, mas as suaves
Melodias, que te ouvi,
São mais dôces que as das aves
Da aldêa onde nasci!
Quem teve, bella captiva,
Coração de te deixar
Aqui enterrada viva,
Sem amor, sem luz, sem ar!
Era cego e surdo, juro,
O miseravel algoz
Que não viu olhar tão puro,
Não ouviu tão pura voz!
Eu não tendo a faculdade
D’arrazar esta prisão,
Sacrifico a liberdade
Por tão dôce escravidão!…
Coimbra.
SONHO
Ha muitos sonhos de imaginação,
De mera phantasia:
Outros, que são a voz da prophecia,
A voz da intuição,
A voz do coração.
Pões fé em sonhos taes, Maria?… Pões?
E fazes bem, que ás vezes
Sonha a gente venturas e revezes,
Que se tornam depois
Bem certos! Ouve pois:
Sonhei que era n’um valle. Anoiteceu.
Então duas estrellas.
(Tão lucidas, tão limpidas, tão bellas!)
Vieram lá do céo
Alumiar-me. E eu…
Não sabia e pergunto: o que buscaes,
Alampadas celestes!
Vós, cá por este mundo… o que perdestes?
Na terra não achaes
Senão prantos e ais!
Respondem-me as estrellas (como a quem
As tivesse captivas,
Tão tremulas! as bellas fugitivas)
– Buscavamos alguem
Que nos quizesse bem:
É sorte nossa, é nossa condição
Dar luz, ser norte e guia;
Mas de mais boamente se alumia
Na terra um coração
Que nos tem affeição.—
– Pois e se vós do céo, lá onde até
Se ignora o que são dôres,
Vindes á terra procurar amores,
Estrellas! se assim é,
Tendes-me aqui ao pé:
Que em summa a noite da minha alma é tal
Que eu pobre viajante
Ando… se para traz, se para diante,
N’este profundo val,
Não sei nem bem mal.
Guiai-me pois, estrellas do Senhor!
E a jura que vos faço
É que na terra não darei um passo
Senão só por amor
Do vosso resplendor!—
Ellas então sorrindo-se, que eu vi,
Tão meigas e suaves!
Voaram como duas lindas aves;
Indo poisar ahi…
N’esse teu rosto… em ti!
Lisboa.
Á VISTA D’UM RETRATO
Amo-te, flôr! Se te amo, Deus que o sabe
Que o diga a teus irmãos, que o céo povoam,
E ebrios de gloria canticos entoam
A quem no mar, na terra e céos não cabe.
Se te amo, flôr! que o diga o mar— que expelle
Quanto é dominio, beija humilde a praia:
Se mal que a lua lá das ondas sáia
Nas rochas me não vê gemer com elle.
Amo-te, flôr! se te amo, o sol que o diga!
Quanto lá da montanha aos céos se eleva,
Se entre os vermes do pó que o vento leva,
Me banha a mim tambem na luz amiga.
Se te amo, flôr? Sem ti, que noite escura,
Meu céo, meu campo em flôr, meu dia e tudo!
Diga-te a noite minha se te illudo,
Se em vida já sem ti, sonhei ventura!
O anjo que a berço humilde e escasso
Do céo me veio alumiar piedoso,
E em lagrimas e riso, pranto e gozo,
Desde então me acompanha passo a passo;
És tu! Amo-te e muito! O que fluctua
Na fornalha que o sopro eterno accende,
Não beija a mão do anjo que o suspende
Com mais amor que eu beijo a sombra tua!
Coimbra.
A LUA
Esse olhar silencioso
Em que lingua se traduz?
Falla-me, oh astro saudoso,
Luz do céo, pallida luz!
Que aereas visões me acordas,
Que imagem, lua, recordas
N’essa prateada côr?
Que ha em ti, que a dôr mitiga,
Que ha em ti, lampada amiga,
De meigo e consolador?
Escuta, pallida lua,
Dá-me um sorriso dos teus,
Dá-me uma lagrima tua,
Se és a pupilla de Deus!
Vê que outros mimos não tenho,
Que em tua face desenho
A face do meu amor:
Uma só lagrima! fria,
Que ella me cáia… diria
Que uma lagrima cahia
Do céo ao menos na dôr!
Coimbra.
JOVEN CAPTIVA
Respeita a foice a espiga verde ainda;
Sem medo da vindima, o estio inteiro,
Bebe o pampano as lagrimas da aurora:
E eu verde como a espiga, tenra e linda
Como o pampano, hei-de morrer? não quero:
Quero, mas não por ora!
Talvez que a outrem, morte, grata fosses.
Espero! Embora em lagrimas me lave,
Varre-me o norte a mim a face? inclino-a.
Se ha dias tristes, ai! ha-os tão dôces…
Sem amargo, que mel, por mais suave
Que mar, em paz continua?
Benefica illusão meu seio habita.
Sepulte-me este carcere inhumano;
A aza nivea da fé não se agrilhôa.
Escapa ao laço da prisão maldita,
Mais viva e alegre, a esse aereo oceano,
A alvéloa canta e vôa.
Hei-de morrer? porque? se não diviso
Em minha alma um remorso; durma ou vele,
Se eu velo e durmo em paz, na paz do justo!
Se em cada rosto a luz me abre um sorriso;
Aqui mesmo, onde a mágoa o riso expelle;
E a luz assoma a custo!
O fim do meu destino é lá tão longe!
Quantos passei dos alemos que adornam
Esta bella viagem? Assentada
Ao banquete da vida apenas hoje,
A taça ainda cheia as mãos entornam,
Dos labios illibada.
Estou na primavera, oh segadores!
E as mais quadras do anno havia agora
De não acompanhar o sol? havia?
Debruçada em meu pé, gloria das flôres,
Eu não vi mais do que raiar a aurora;
Quero acabar meu dia.
Espera um pouco, oh morte! nada perdes.
Antes consola os que o remorso, o medo,
O desalento pallido devora!
Guarda-me ainda o campo grutas verdes!
As musas, cantos! e o amor… Segredo!
Não morro, não, por ora!
Assim, encarcerada, o rosto lindo
E a vista alçando a regiões ignotas,
Minha musa entoou na fé mais viva:
E eu, as languidas mágoas sacudindo,
Moldei em dôce verso as dôces notas
D’essa joven captiva!
André-Chénier.
Coimbra.
* * *
Mulher! quando nos braços
Te escuto uma canção,
Não vês em meus abraços
Profunda commoção?
É que o teu canto á mente
Me traz vida melhor…
Ah!
Cantai continuamente,
Cantai, oh meu amor!
Quando sorris, assume
Teu rosto uma expressão,
Que o mais feroz ciume
Se desvanece então.
Sorriso tal desmente
Um coração traidor…
Ah!
Sorri continuamente,
Sorri, oh meu amor!
Quando tranquilla e pura,
Te estou a vêr dormir,
Que vozes se afigura
Teu halito exprimir?
Contemplo então contente
Teu corpo encantador…
Ah!
Dormi continuamente,
Dormi, oh meu amor!
Letra de V. Hugo. Musica de Gounod.
Lisboa.
UM BEIJO
Seria o beijo
Que te pedi,
Dize, a razão
(Outra não vejo)
Porque perdi
Tanta affeição?
Fiz mal, confesso;
Mas esse excesso,
Se o commetti,
Foi por paixão,
Sim, por amor
De quem?… de ti!
Tu pensas, flôr,
Que a mulher basta
Que seja casta,
Unicamente?
Não basta tal.
Cumpre ser boa,
Ser indulgente.
Fiz-te algum mal?
Pois bem: perdôa!
É tão suave
Ao coração
Mesmo o perdão
D’offensa grave!
Se o alcançasse,
Se o conseguisse,
Quizera então
Beijar-te a mão,
Beijar-te a face…
Beijar? que disse!
(Que indiscrição…)
Perdão! perdão!
Lisboa.
FRANCISCA DE RIMINI
Disse eu então: poeta, vês aquelles,
Abraçados, velozes como o vento?
Desejava poder fallar com elles.
– Chamando-os com enternecimento,
Em cá passando mais do nosso lado,
São dois amantes, lograrás o intento.
Assim que o vento os aproxima, brado:
Oh almas d’uma eterna anciedade,
Vinde fallar-me, se vos isso é dado.
Como um casal de pombas, com saudade
Do ninho, vem no ar, d’aza espalmada,
Não mais que por impulso da vontade;
Rompendo aquella aragem empéstada,
Acodem lá do bando onde anda Dido
Á supplica tocante e magoada.
«Ah mortal generoso e condoído,
Que nos visita n’este escuro horrendo,
Deixando nós de sangue o chão tingido!
«Do Senhor impetráramos podendo,
Já que tens dó do nosso mal enorme,
O teu descanço eterno em fallecendo.
«Queiras ouvir-nos ou fallar, conforme,
É só dizer ou perguntar, mais nada;
Em quanto o vento, como agora, dorme.
«A terra, onde nasci, fica assentada
Na praia onde a final o Pó descança,
E os que o seguem na marcha arrebatada.
«Amor, que em nenhum moço acha esquivança
Prendeu este a um corpo… que roubado
Foi á minha alma em barbara vingança!
«Amor, que obriga amar quem é amado,
Poz-me com elle tão condescendente,
Que ainda, como vês, me anda abraçado.
«Amor nos deu a morte juntamente.
Quem nos matou irá para as Caínas.»
Disseram elles isto fielmente.
Depois d’ouvir as victimas mofinas,
Scismando cabisbaixo, em tal postura,
Pergunta-me o poeta: em que imaginas?
Começo respondendo: oh desventura!
Quanta esperança! quanta sympathia
A ambos não cavou a sepultura!
E voltando-me a quem me referia:
Olha Francisca! dó dos teus tormentos
Estas lagrimas tristes desafia.
Mas na quadra dos vagos sentimentos,
Conta-me: como foi que conheceste
Os amorosos languidos momentos!
«O desgosto maior d’um triste é este,
Fallar do tempo que passou, confesso:
Que o diga o proprio guia que trouxeste
«Mas desejando tu com tanto excesso
Conhecer de raiz esta amizade,
Entre vozes e lagrimas começo:
«Liamos ambos, por curiosidade,
Certa historia d’amores, que idearam,
Nós sós, um dia, livres de maldade.
«Muita vez nossos olhos se espantaram,
E descoramos, lendo a historia estranha;
Mas dos lances que mais nos abalaram,
«Foi quando em summa o terno amante apanha
O dôce beijo, por que andava ardendo:
Este, que eternamente me acompanha,
«Beija-me a bocca a mim, todo tremendo!
A culpa foi do livro que se lia!
Não se continuou o dia lendo.»
Em quanto assim Francisca respondia,
Chorava Paulo, a ponto, d’aterrado
Me vêr nas convulsões da agonia,
E cahir, como um corpo inanimado!
Dante.
Lisboa.
PAIXÃO
Suppõe que d’uma praia, rocha ou monte,
Com essa vista embaciada e turva
Que dá aos olhos entranhavel dôr;
Tinhas podido vêr transpôr a curva,
Pouco a pouco, do liquido horisonte,
A saudosa barca, que levasse
Aquelle, a quem primeiro uniste a face
E o teu primeiro amor!
Depois, que toda mágoa e saudade,
Da mesma rocha ou alcantil deserto,
Olhando ávidamente para o mar;
Vias na solitaria immensidade,
Vagas ficções d’um pensamento incerto,
Surgir das ondas, desfazer-se em espuma;
Não alvejando, nunca, vela alguma
E, sempre, a suspirar.
Até que á luz d’uma intuição sublime
D’alma arrancavas o gemido extremo
De saudade, desespero e dôr!…
Pois é assim que eu soffro, assim que eu gemo!
Que nuvem negra o coração me opprime;
Nuvem de mágoa, nuvem de ciume,
Em te não vendo á hora do costume,
Meu anjo e meu amor!
Lisboa.
ESCREVE!
Não sei o que suppôr
Do teu silencio. Escreve!
Quem é amado deve
Ser grato ao menos, flôr!
Se eu fosse tão feliz
Que te fallasse um dia
De viva voz, diria
Mais do que a carta diz.
Mas, olha, tal qual é
Não rias d’esse escripto
Que, pouco ou muito, é dito
Tudo de boa fé.
Ha n’esse teu olhar
A dôce luz da lua,
Mas luz que se insinua
A ponto de abrazar…
Pareça n’elle sim
Que ha só doçura, embora:
Ha fogo que devora…
Que me devora a mim!
Que mata, mas que dá
Uma suave morte;
Mata da mesma sorte
Que uma arvore que ha:
Que ao pé se lhe ficou
Acaso alguem dormindo
Adormeceu sorrindo…
Porém não acordou.
Esse teu seio então,
Que encantadora curva!
Como de o vêr se turva
A vista e a razão!
Como até mesmo o ar
Suspende a gente logo…
Pregando olhos de fogo
Em tão formoso par!
Oh seio encantador,
Delicioso seio!
Que jubilo, que enleio
Libar-lhe o nectar, flôr!
Eu tenho muita vez
Já visto a borboleta
Na casta violeta
Poisar os leves pés:
E n’um enlevo tal,
N’uma avidez tamanha,
Que a gente a não apanha
Com dó de fazer mal!
Pegada á flôr então
No pé curvinho e molle,
As azas nem as bole
Toda sofreguidão!
Poisou… adormeceu!
Só vê, só ouve e sente
O calix rescendente
D’aquelle mel do céo!
Pois vê com que prazer
E com que ardente sêde
Te havia… (que não hei-de!…)
Tambem beijar, sorver!
Mas eu só peço dó,
Só peço piedade!
Mata-me a saudade
Com duas linhas só!
Eu, a não ser em ti
Achar allivios, onde?
Escreve-me! responde
Á carta que escrevi!
Cançado de esperar
Ás vezes quando sáio,
Pensas que me distraio?
Pois volto com pezar!
Concentra-se-me em ti
A alma de tal modo
Que esse bulicio todo
Nem o ouvi, nem vi!
Ninguem te substitue,
Porque só tu és bella!
Que estrella a minha estrella,
E que infeliz que eu fui!
Mas devo-te suppôr
Sempre indulgente e boa,
Escreve-me e perdôa
Meu violento amor!
Respeita uma affeição
Inutil mas sincera.
Tu és mulher, pondera
O que é uma paixão.
Com sangue era eu capaz
De te escrever; portanto,
Tinta não custa tanto!
E não me escreverás?
Uma palavra, sim,
Que me não amas… Queres?
Em quanto me escreveres,
Tu pensarás em mim!
Só essa idéa, crê,
Encerra mais doçura
Que as provas de ternura
Que outra qualquer me dê!
Lisboa.
MALMEQUER
Talvez em eu morrendo a teus ouvidos
Chegue a noticia, que hoje os factos vôam,
E oiças então os intimos gemidos
Que exhalo e te não sôam.
Talvez então, embora me não ames,
Com esses olhos humidos de fito
Na minha sombra: «Desgraçado! exclames;
Amava-me, acredito.
«Levou a vida amando-me: que prova
Me podia alguem dar de mais ternura,
Ingrata como eu era! Abri-lhe a cova,
Cavei-lhe a sepultura!
«Hei-de regal-a de meu pranto. Julgo
Do meu dever… agradecer-lhe agora!
Purificar-me em lagrimas! O vulgo
Que me censure embora.
«Hei-de ir dispôr um pé de saudade
Na terra onde elle descançou da lida;
Mostrar-lhe amor, mostrar-lhe piedade,
Que não mostrei em vida!»
Se fôres, meu amor! uma perpetua,
E uma saudade ser-me-hia dôce!
Mas só perpetua ou saudade, aceito-a,
E um malmequer que fosse.
Lisboa.
VIRGINIA
Para se recitar no theatro do Príncipe-Real
Senhores! vêde o sol; diariamente
Nasce, cruza esse espaço e, no poente,
Acaba de brilhar.
É util, é preciso, é necessario,
Não é pois inconstante, não é vario;
É certo, é regular!
Hervas que nutrem, animaes que comem,
E a imagem de Deus— que falla— o homem,
Sem essa luz, dizei:
Vegetavam acaso, existiriam?
Os echos d’esses valles repetiam
Alguma voz? O que!…
Seria tudo um ermo escuro e mudo;
Tudo insensivel, solitario tudo!
Mas Deus cria essa luz;
E um mar sem praias de silencio e morte,
Sêres de toda a casta— toda a sorte,
Produz e reproduz!
Sim, essa luz benefica converte,
Por mysteriosa alchimia, frio, inerte,
Imperceptivel grão
Em tenras hastes, em botões mimosos,
Folhas, flôres e fructos saborosos
Que recamam o chão!
Mas julgaes vós agricola sómente
A mão do creador omnisciente?
Pergunta singular!
Basta só vêr a ondeada trança
Com que elle adorna a virgem que vos lança
O seu primeiro olhar!
A terra é de côr varia, a planta, verde:
Porque e para que? O que se perde
Em ter tudo uma côr?
O que se ganha em ser tão bem pintada,
Symetrica, mimosa, perfumada
Uma ephemera flôr?
É que Deus é artista! e noite e dia
E céo e terra e mar o denuncia…
Vêde nascer o sol!
Pôr-se alta noite a lua encantadora…
Em quanto ao mesmo tempo canta e chora
Ao longe o rouxinol!
Deus é artista, sim; Deus ama o bello,
Mais talvez do que o util. O desvelo
Com que elle trata a flôr!
Antes de abrir… que mãi tão carinhosa
Resguarda, mais solicita que a rosa,
Um seu botão d’amor!
Nem podia sahir obra incompleta
Das mãos de Deus: geometra e poeta
Em summo grau, traçou
A compasso a abobada celeste;
Mas de que lindas nuvens a reveste
Que ao vento tomam vôo!
Creou, de fogo, o sol— o grande astro!
E creou, não de fogo, d’alabastro
A sua bella irmã
– Sombra apenas do sol, desnecessaria,
Luz phantastica, vaga, solitaria,
Inutil, fátua, vã…
Mas luz intima! luz do sentimento!
Luz d’amor e de fé! que inspira alento
A nossos corações!
Unica luz, á qual se mede o fundo
D’esse concavo mar… d’esse outro mundo…
D’esse mundo de soes!
Porque se ao sol deveis fructos e flôres,
Á lua deveis mais, deveis amores…
Deveis… como direi?
Esta entranhavel, vaga saudade
De não sei que melhor realidade,
Que o mundo que se vê…
Quantas vezes, depois da lida insana
D’um dia, n’este mar da vida humana,
Vendo surgir no céo
Essa luz melancolica e suave,
Eu acho então, e com que allivio, a chave
D’este mysterio meu!..
D’este amor por phantasticos amores…
Comtudo mais leaes e duradores
Que os d’esse mundo são!
D’este mundo de sombras… até prestes,
Sombra tambem, á sombra dos cyprestes
Achar satisfação!
E eu digo, digo á lua scismadora
Com os olhos risonhos de quem chora
Pranto consolador:
Se pois Deus te creou porque eras bella…
O que vale o sol mais do que uma estrella?
Um rei do que um pintor?
Ao vêr-te, dôce lampada, suspensa
De vaporosa nuvem, n’essa immensa
Abodada dos céos,
Pareces-me o thuribulo sagrado
Com os rolos de incenso evaporado
Em tua honra, oh Deus!
E a minha vista sofrega acompanha
Esse clarão phantastico á montanha
Ou da terra ou do mar,
Onde, acabada a obra do seu dia,
Astro d’amor e de melancolia,
Se deita a descançar.
E eu descanço tambem; filha da arte…
Cumpre-me a mim, oh lua, contemplar-te!
E pergunte-me alguem:
– Tu que fazes no mundo, mulher futil?
– O que Deus faz… na flôr, na lua inutil…
Sou artista tambem.
Lisboa.
Türler ve etiketler
Yaş sınırı:
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24 ağustos 2016Hacim:
80 s. 1 illüstrasyonTelif hakkı:
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