Kitabı oku: «Arena Um: Traficantes De Escravos », sayfa 10
Mas Ben apenas olha para baixo, com seu rosto em suas mãos e então balança a cabeça.
“Bom, eu não tenho chance,” ele fala.
“Se você pensar desta forma, então não terá,” eu retruco. É uma frase que papai usava muito comigo e estou surpresa de ouvir estas mesmas palavras saindo de minha boca. Incomoda-me pensar o quanto dele, exatamente, eu absorvi. Posso ouvir a coragem em minha própria voz, uma coragem que eu nunca havia reparado até hoje, e eu quase sinto que ele está falando através de mim. É uma sensação estranha.
“Ben,” eu falo. “Se você acha que pode sobreviver, se você pode se ver sobrevivendo, então você conseguirá. Tudo depende do que você se obriga a imaginar em sua cabeça. Depende do que você fala para si mesmo.”
“Isso é só mentir para si mesmo,” Ben fala.
“Não é não,” eu respondo. “Isto é auto treinamento. Existe uma diferença. É ver seu próprio futuro, o que você quer ver e criá-lo na sua cabeça e então fazê-lo acontecer. Se você não pode vê-lo, então não pode criá-lo.”
“Você soa como se realmente acreditasse que pode sobreviver,” Ben fala, parecendo maravilhado.
“Eu não acredito nisso,” respondo. “Eu sei disso. Eu vou sobreviver. Eu sobreviverei,” eu me ouço falando com uma crescente confiança. Sempre tive a habilidade de usar meus pensamentos para levantar meu astral, mentalizar tanto que não há como voltar atrás. Apesar de tudo, me vejo cheia com uma nova confiança restaurada, um novo otimismo.
E, imediatamente, neste momento, eu faço uma decisão: estou determinada a sobreviver. Não por mim. Mas por Bree, Afinal, eu ainda não sei se ela está morta. Ela ainda pode estar viva. E só terei chance de salvá-la se eu continuar viva. Se eu sobreviver nesta arena. E se é isso que preciso fazer, é isso que farei.
Eu vou sobreviver.
Não vejo porque eu não teria uma chance. Se há uma coisa que eu posso fazer é lutar. Fui criada para ser boa nisso. Já estive em um ringue antes. Já levei surra. E fiquei mais forte por isso. Não tenho medo.
“Então, como você vai fazer para vencer?” Ben pergunta. Desta vez, sua pergunta parece genuína, parece que ele realmente acredita que eu seja capaz. Talvez algo em minha voz o convenceu.
“Eu não preciso vencer,” respondo, calmamente. “É isso. Só preciso sobreviver.”
Eu mal acabo de falar essas palavras quando ouço o som de botas de combate marchando pelo corredor. Um momento depois, há o som da porta se abrindo.
Eles vieram.
QUINZE
A porta de nossa cela abre com um gemido e luz do corredor inunda o interior. Levanto minhas mãos até meus olhos, protegendo-os e vejo a silhueta de um comerciante de escravos. Eu espero que ele marche até mim e me leve embora mas, ao invés disso, ele se abaixa, coloca algo duro e de plástico no chão e o chuta, este raspa pelo chão e para abruptamente ao bater nos meus pés.
“Sua última refeição,” ele anuncia com uma voz sombria.
E então sai e fecha a porta, trancando-a.
Eu já sinto o cheiro da comida daqui e meu estômago reage com uma pontada aguda de fome. Eu me inclino e pego o recipiente de plástico com cuidado, mal conseguindo com a fraca luz: é longo e achatado, selado com alumínio. Eu retiro o alumínio e imediatamente sinto cheiro de comida – de verdade, cozida, como não como há anos – que vem até mim, ainda mais poderoso. Tem cheiro de bife. E frango. E batatas. Debruço-me para examiná-lo: há um grande e suculento bife, duas coxas de frango, purê de batatas e vegetais. É a melhor refeição da minha vida. Sinto-me mal por Bree não estar aqui para dividi-la.
Pergunto-me porque eles me deram uma refeição tão extravagante e percebo que não é um ato de bondade, mas uma ação para o próprio bem deles: eles me querem forte na arena. Talvez também estejam me seduzindo uma última vez, oferecendo uma visão de como a vida seria se eu aceitasse a sua oferta. Refeições de verdade. Comida quente. Uma vida de luxo.
À medida que o odor invade cada poro do meu corpo, a oferta deles se torna mais e mais atraente. Não sinto o cheiro de comida de verdade em anos. De repente, percebo como estou faminta, como estou malnutrida e eu realmente me pergunto se, sem esta refeição, eu teria forças para lutar.
Ben senta-se e se inclina para frente, olhando. É claro. Eu imediatamente me sinto egoísta por não pensar nele. Ele deve estar tão faminto quanto eu e tenho certeza que o cheiro, que tomou conta da cela, está deixando-o louco.
“Divida comigo,” eu digo no escuro. Preciso de toda a minha força de vontade para fazer esta oferta – mas é a coisa certa a ser feita.
Ele sacode a cabeça.
“Não,” ele diz. “Eles falaram que era para você. Coma. Quando eles vierem me pegar, eu também terei uma refeição. Você precisa disso agora. É você quem vai lutar.”
Ele está certo. Eu preciso disso agora. Especialmente porque eu não planejo apenas lutar – eu pretendo ganhar.
Eu não preciso de muito para ser convencida. O odor da comida me oprime, eu estendo minha mão, agarro a coxa de frango e a devoro em segundos. Como mordida atrás de mordida, mal parando para engolir. É a coisa mais deliciosa que já experimentei. Mas eu me forço a guardar uma das coxas para Ben. Ben talvez tenha sua própria refeição – ou talvez não. De qualquer forma, após tudo o que passamos juntos, sinto que é certo dividir.
Vou para o purê de batatas, uso meus dedos para levá-lo a minha boca. Meu estômago grunhe de dor e eu me dou conta que preciso desta refeição, mais que qualquer outra que já tive. Meu corpo grita para que eu pegue mais uma mordida, e então mais outra. Eu como rápido demais e, em momentos, devorei mais da metade. Forço-me a deixar o resto para Ben.
Levanto o bife com meus dedos e pego grandes pedaços, mastigo devagar, tentando saborear cada bocado. É a melhor coisa que já tive em minha vida. Se está for mesmo minha última refeição, estou contente com ela. Reservo metade da carne e sigo para os vegetais, comendo apenas metade deles. Em pouco tempo, terminei – e ainda não me sinto satisfeita. Olho para baixo, para o que deixei para Ben e quero comer cada última mordida. Mas junto todo a minha força de vontade, fico de pé, cruzo a sala e seguro a bandeja para ele.
Ele está sentado, a cabeça repousando em seus joelhos, não olha para cima. É a pessoa de aparência mais derrotada que já vi. Se fosse eu sentada ali, eu o veria comer cada mordida, imaginaria o gosto da comida. Mas parece que ele não tem mais vontade de viver.
Ben deve sentir o cheiro da comida, tão perto, porque ele finalmente levanta a cabeça. Olha para mim, seus olhos arregalados de surpresa. Eu sorrio.
“Você não achou mesmo que eu comeria tudo, achou?” eu pergunto.
Ele sorri, mas balança a cabeça e a abaixa. “Não posso,” ele fala. “É sua.”
“É sua agora,” eu falo, e empurro em suas mãos. Ele não tem alternativa a não ser aceitar.
“Mas não é justo —” ele começa.
“Eu já tive o suficiente,” eu minto. “Além disso, preciso permanecer leve para a luta. Não poderei me movimentar com estômago cheio, não é?”
Minha mentira não é muito convincente e eu posso notar que ele não acreditou. Mas também posso ver o efeito que a comida tem nele, posso ver sua necessidade primária tomando o controle. É o mesmo impulso que tive minutos atrás.
Ele pega a comida e a devora. Fecha seus olhos e se inclina para trás, respirando fundo, mastigando, saboreando cada mordida. Eu o vejo terminar de comer e percebo que ele precisava muito daquilo.
Ao invés de atravessar a sala e voltar para o meu lado da cela, sento-me na parede ao lado dele. Não sei quanto tempo eu tenho até que venham me buscar e, por algum motivo, tenho vontade de ficar próxima a ele nestes últimos minutos que temos juntos.
Ficamos sentados, silenciosamente, um do lado do outro, não sei por quanto tempo. Estou tensa, ouvindo cada barulho, constantemente me perguntando se eles estão vindo. Quando penso no que está por vir, meu coração dispara e tento tirar isso da minha cabeça.
Supus que eles levariam nós dois juntos para arena e estou surpresa que estão nos separando. Isso me faz imaginar que outras surpresas nos aguardam. Tento não pensar em nada disso.
Não consigo deixar de imaginar se esta será a última vez que verei Ben. Eu não o conheço há muito tempo e nem deveria me importar tanto. Sei que deveria manter minha mente limpa, minhas emoções calmas e me concentrar apenas na luta que vou enfrentar.
Mas, por alguma razão, não consigo parar de pensar nele. Não tenho certeza porque mas, de algum jeito, estou começando a me sentir apegada a ele. Vou sentir sua falta. Isto não faz o menor sentido e estou brava comigo mesma por pensar desta forma. Eu mal o conheço. Deixa-me incomodada que ficarei chateada – mais chateada do que deveria – em me despedir.
Permanecemos sentados, em um silêncio relaxante, um silêncio entre amigos. Não é mais desconfortável. Não falamos mas eu sinto que, neste silêncio, ele está me ouvindo dizer adeus. E ele também está se despedindo.
Eu espero que ele diga alguma coisa –qualquer coisa – para mim. Após alguns minutos, uma parte de mim começa a pensar que talvez ele não esteja falando por alguma razão, talvez ele não sinta a mesma coisa por mim. Talvez ele sequer se importe comigo no final das contas; talvez ele até esteja ressentido por eu metê-lo no meio desta confusão. De repente, tenho dúvidas. Preciso saber.
“Ben?” eu sussurro, no silêncio.
Eu espero, mas tudo o que ouço é o som de sua respiração ruidosa, através de seu nariz quebrado. Olho para o lado e vejo que ele caiu no sono. Isto explica o silêncio.
Examino seu rosto e, mesmo ferido como está, é belo. Odeio a ideia de nos separarmos. E de sua morte. Ele é muito jovem para morrer. E eu também, eu acho.
A refeição me deixa sonolenta e, nesta escuridão, apesar de tudo, sinto meus olhos se fechando. Antes de perceber, estou caída contra a parede, deslizando minha cabeça até me encostar no ombro de Ben. Sei que deveria ficar acordada, alerta, me preparando para a arena.
Mas, em momentos, apesar de meus esforços, adormeço.
*
Acordo com o eco de botas marchando pelo corredor. A princípio, acho que é apenas um pesadelo – e então percebo que não é. Não sei quantas horas se passaram. Porém, meu corpo parece descansado e isto me diz que eu dormi por um bom tempo.
O barulho das botas fica mais alto e logo param em frente à porta. Há um som agudo de chaves e eu me sento ereta, meu coração batendo como se fosse sair do meu peito. Eles vieram.
Não sei como dizer adeus a Ben e nem sei se ele quer que eu diga. Por isso fico apenas levantada, cada músculo em meu corpo doendo, me preparando para ir.
De repente, sinto uma mão em meu pulso. É surpreendentemente forte e a intensidade de seu aperto se propaga em mim.
Estou com medo de olhar para baixo e vê-lo, olhar naqueles olhos – mas não tenho escolha. Ele está me encarando. Seus olhos irradiam preocupação e, neste momento, posso ver o quanto ele se importa comido. Essa intensidade me assusta.
“Você fez muito bem,” ele fala, “nos trouxe até aqui. Não teríamos vivido tanto tempo.”
Eu olho de volta, não sabendo o que responder. Quero dizer que sinto muito por tudo isso. Também quero falar que me importo com ele. Que espero que ele sobreviva. Que eu sobreviva. Que o verei novamente. Que encontraremos nossos irmãos. Que iremos para casa.
Mas sinto que ele já sabe disso tudo. Então acabo não falando nenhuma palavra.
A porta se abre e os comerciantes de escravos entram marchando. Eu me viro para partir mas Ben segura meu pulso, me forçando a olhar para ele.
“Sobreviva,” ele diz, com a intensidade de um homem à beira da morte.
Eu encaro de volta.
“Sobreviva. Por mim. Por sua irmã. Por meu irmão. Sobreviva.”
As palavras ressoam no ar como uma ordem, e eu não consigo de sentir que elas vieram de papai, canalizadas através de Ben. Um calafrio corre pela minha espinha, Antes, eu estava determinada a sobreviver. Agora, sinto que não tenho escolha.
Os comerciantes de escravos marcham e ficam atrás de mim.
Ben me solta e eu me viro e fico parada com orgulho, encarando-os. Sinto uma onda de força proveniente da comida e do descanso e os olho fixamente, desafiante.
Um deles segura uma chave. A princípio, não entendo porque – mas então me lembro de minhas algemas. Elas estão em mim há tanto tempo que havia esquecido delas.
Estendo meus pulsos e ele as retira. Há um grande alívio da tensão, quando o metal é solto e retirado. Esfrego meus pulsos onde as marcas circulares estão.
Saio da sala antes que eles possam me empurrar, querendo esta distância. Sei que Ben está me vendo mas não posso suportar a ideia de olhar para ele. Preciso ser forte.
Eu preciso sobreviver.
DEZESSEIS
Os comerciantes de escravos me levam pelo corredor e, ao caminhar pelas estreitas e intermináveis passagens, começo a ouvir um murmúrio débil. A princípio, é difícil distinguir. Mas, à medida que vou me aproximando, começa a soar como uma multidão. Uma multidão de espectadores, com gritos intermitentes.
Passamos por outro corredor e o barulho se torna mais claro. Há um rugido enorme, seguido de um estrondo, como um terremoto. O corredor realmente estremece. Parece a vibração de cem mil pessoas batendo os pés no chão.
Sou empurrada para a direita, descendo por outra passagem. Não gosto de ser cutucada e encostada por estes comerciantes de escravos, ainda mais porque estão me guiando para minha morte e não há nada que me agradaria mais que me virar e derrubar um deles. Mas estou desarmada e eles são maiores e mais fortes, seria uma situação sem saída. Além disso, preciso conservar minha força.
Sou cutucada uma última vez e o saguão se abre. Ao longe, uma luz forte aparece como um refletor e o barulho da multidão cresce inconcebivelmente alto, como se fosse uma coisa viva. O corredor se abre em um túnel largo e alto. A luz fica cada vez mais brilhante e, por um momento, pergunto-me se estou andando sob a luz do dia.
Mas a temperatura não mudou. Ainda estou no subsolo e estou andando pela entrada de um túnel. Para a arena. Lembro-me da vez em que papai me levou a uma partida de beisebol, quando nos dirigíamos aos nossos assentos, andando dentro do estádio – quando andamos por um túnel e, de repente, o estádio se abria a nossa frente. Enquanto caminho, descendo a rampa, tenho a mesma sensação. Só que desta vez eu sou a estrela do show. Eu paro e olho, assombrada.
Diante de mim, há um estádio enorme, cheio de milhares e milhares de pessoas. No centro, há um ringue, com a forma de um octógono; parece um ringue de boxe só que, ao invés de haver cordas no perímetro, há uma jaula de metal. A jaula se eleva alto no ar, uns cinco metros, fechando completamente o ringue, a não ser pelo seu teto aberto. Lembra uma estrutura que uma vez fora utilizada no UFC (Ultimate Fighting Champioship), só que maior. E esta jaula, coberta de manchas de sangue, com pontas de ferro no interior, sobressaindo a cada três metros mais ou menos, obviamente não é para esportes – e sim para morte.
Ouço o som de metal rangendo. Duas pessoas estão lutando dentro do ringue e um deles acabou de ser jogado contra a jaula. Seu corpo bate no metal, por pouco, não atingiu uma ponta, e a multidão irrompe em gritos.
O oponente menor, coberto de sangue, cai das grades, desorientado. O maior, enorme, parece um lutador de sumô. Ele é asiático e deve pesar pelo menos uns duzentos e vinte quilos. Após lançar o homem pequeno e magro, o lutador de sumô ataca, o agarra com as duas mãos e o levanta por cima de sua cabeça, como se fosse uma boneca. Ele faz círculos lentamente e a plateia aplaude freneticamente.
Ele joga o homem através do ringue, que se estatela de lado na jaula, desviando, por pouco, de uma ponta de ferro. Ele aterrissa no chão duro, sem se mover.
A multidão inteira vibra com rugidos e pula de pé, gritando.
“ACABE COM ELE!” um espectador berra, por cima do estrondo.
“MATE-O!” outro grita.
“ACABE COM ELE!”
Milhares de pessoas começam a gritar, batendo suas botas nas grades de metal e o barulho se torna ensurdecedor. Sumô levanta seus braços, recebendo tudo, circulando lentamente, saboreando o momento. Os vivas ficam mais altos.
Sumô, lenta e ameaçadoramente, cruza o ringue, em direção ao homem inconsciente, que está deitado de cabeça para o chão. Quando se aproxima, ele repentinamente cai sobre um joelho, com tudo, direto nas costas do homem menor. Há um ruído repugnante quando seus duzentos e vinte quilos esmagam a coluna vertebral do outro, estraçalhando-a. A plateia geme, fica claro que ele quebrou as costas do homem.
Eu me viro, não querendo olhar, me sentindo angustiada pelo homem pequeno, indefeso. Imagino porque eles não acabam logo com isso. Obviamente, o fortão ganhou.
Mas, aparentemente, eles não planejam acabar com isso – Sumô ainda não terminou. Ele agarra o corpo inerte do homem com as duas mãos, o levanta e o joga de cara pelo ringue. O homem bate na gaiola de metal e colapsa no chão de novo. A multidão ruge. Seu corpo cai em uma posição não natural, não sei dizer se ele está morto ou não.
O lutador ainda não está satisfeito. Ele levanta seus braços, fazendo círculos devagar, a multidão faz coro.
“SU-MÔ! SU-MÔ! SU-MÔ!”
Os gritos alcançam um grau ensurdecedor até que Sumô cruza o ringue uma última vez, levanta um pé e o abaixa na garganta do homem indefeso. Ele fica em pé com os dois pés na garganta do outro, esmagando-a. Os olhos do homem se arregalam quando ele estende suas duas mãos, tentando se livrar dos pés em seu pescoço. Mas é inútil e, após alguns segundos de sufocamento, ele finalmente para. Suas mãos caem ao seu lado, moles. Está morto.
A plateia pula de pé, urrando.
Sumô pega o corpo morto, levanta por cima de sua cabeça e o lança através do ringue. Desta vez, ele mira em uma das pontas de ferro protuberantes e empala o homem com ela. O corpo fica pendurado ao lado da jaula, uma ponta atravessando o estômago e sangue pingando.
A plateia berra ainda mais alto.
Sou empurrada por trás e tropeço sob a luz brilhante, descendo pela rampa, em direção ao estádio aberto. Quando entro, percebo exatamente onde estou: é o antigo Madison Square Garden. Exceto que agora o local está em ruínas, o teto está caindo, luz solar e água infiltram e as grades estão enferrujadas e corroídas.
A multidão deve ter me visto, pois viram em minha direção e deixam escapar um grito de expectativa. Olho atentamente para os rostos, que gritam e vibram, e vejo que são todos Biovítimas. Suas faces são deformadas, derretidas. A maioria deles são magrelos como um pau, subnutridos. Eles compreendem um dos tipos de aparência mais sádica que eu já vi e há uma enorme variedade deles.
Sou guiada rampa abaixo, em direção ao ringue e, quando chego nele, sinto milhares de olhos fixos em mim. Há zombarias e vaias. Aparentemente, eles não gostam de novatos. Ou, talvez, simplesmente, não gostem de mim.
Sou levada para o lado do ringue e empurrada para uma pequena escada de metal em um dos lados da jaula. Olho para Sumô, que franze o cenho para mim de cima do ringue. Dou uma olhada no cadáver, ainda empalado na jaula. Hesito: não estou ansiosa para entrar neste ringue.
Sou cutucada com força pela ponta de uma pistola na minha lombar e então não tenho escolha a não ser dar meu primeiro passo na escada. E então outro. E outro. A multidão vibra e sinto fraqueza em meus joelhos.
Um comerciante de escravos abre a porta da jaula e dou meu primeiro passo dentro. Ele fecha a porta atrás de mim e eu não consigo deixar de estremecer. A plateia ruge de novo.
Viro-me e inspeciono o estádio, procurando por qualquer sinal de Bree, de Ben ou de seu irmão – algum rosto conhecido. Mas não há nenhum. Forço-me a olhar para o outro lado do ringue, para meu oponente. Sumô está lá parado, olhando para mim. Ele sorri e então irrompe em gargalhadas ao me ver. Tenho certeza que acha que serei uma morte fácil. Eu não o culpo.
Sumô vira de costas para mim e levanta seus braços bem alto, olhando para a plateia, procurando adulação. Claramente, eu não o incomodo e ele acredita que esta luta já está ganha. Ele já está desfrutando de sua próxima vitória.
A voz de papai invade minha cabeça:
Seja sempre a primeira a começar uma luta. Nunca hesite. Surpreenda com sua melhor arma. Uma luta começa quando VOCÊ a inicia. Se você esperar que seu oponente comece, você já perdeu. Os primeiros três segundos de uma luta sempre definem seu resultado. Vamos. VAMOS!
A voz de papai ecoa em minha cabeça e eu a deixo que me domine. Não paro de pensar em como isto é insano, como estou em desvantagem. Tudo o que eu sei é que, se eu não fizer nada, vou morrer.
Deixo me levar pela voz de papai, é como se meu corpo estivesse sendo controlado por outra pessoa. Vejo-me atacando através do ringue, concentrada em Sumô. Suas costas ainda estão viradas para mim, seus braços ainda estão imóveis, ele continua curtindo o espetáculo. E, agora, pelo menos neste momento, ele está exposto.
Corro pelo ringue, cada segundo parecendo uma eternidade. Foco no fato de ainda estar utilizando estas botas de combate, com as pontas dos pés feitas de metal. Dou três grandes passos e, antes que Sumô possa reagir, salto no ar. Voo pelo ar, deixando que o impulso me carregue e miro, cuidadosamente, bem atrás de seu joelho esquerdo.
Quanto maior o oponente, maior sua queda, eu escuto papai dizer.
Rezo para que ele esteja certo.
Só tenho uma chance aqui.
Eu o chuto atrás de seu joelho com toda a força que tenho. Sinto o impacto de minhas botas com pontas de ferro em sua carne macia e torço para que dê certo.
Para minha surpresa, seu joelho se torce sobre ele e ele aterrissa em um joelho no chão do ringue, sacudido pelo seu peso.
A plateia, de repente, ruge de deleite e surpresa, certamente não esperavam por isso.
O maior erro que você pode fazer em uma luta é atingir alguém e sair. Você não ganha uma luta com apenas um soco ou apenas um chute. Você ganha com combinações de golpes. Após chutá-lo, chute-o de novo. E de novo. E de novo. Não pare até que ele não possa mais se levantar
Sumô começa a se virar em minha direção, com cara de assombro. Eu não espero.
Eu me balanço e lhe planto um chute circular perfeitamente na parte de trás de seu pescoço. Ele cai de cara no chão, batendo com tudo, estremecendo o solo com seu peso. A multidão ruge.
De novo, não posso esperar. Eu pulo para aplicar uma voadora, afundando os calcanhares de minhas botas em sua lombar. Então, sem pausa, me levanto e o chuto com força na lateral do rosto, o ferro da bota atingindo sua têmpora. O ponto fraco. Chuto de novo, e de novo e de novo. Logo, ele está coberto de sangue e estende as mãos para proteger sua cabeça.
A plateia enlouquece. Eles ficam de pé, gritando.
“MATE-O!” eles berram. “ACABE COM ELE!”
Mas eu hesito. A visão dele ali deitado, inerte, faz eu me sentir mal. Sei que não deveria – é um assassino sem escrúpulos – mas, ainda assim, não consigo forças para matá-lo.
E este é meu grande erro.
Sumô toma vantagem da minha hesitação. Antes que eu perceba, ele estende sua mão e agarra meu tornozelo. Sua mão é enorme, inacreditavelmente enorme, e aperta minha perna como se fosse um galho. Com um fácil movimento, ele puxa minha perna, me faz girar e me manda voando pelo ringue.
Eu bato na jaula de metal, escapando por pouco das pontas afiadas e caio no chão.
A plateia vibra. Olho para cima, atordoada, minha cabeça girando. Sumô já está se levantando para atacar. Sangue escorre de seu rosto. Não acredito que fiz aquilo. Não acredito que ele seja vulnerável. E, agora, ele deve estar furioso.
Estou chocada ao ver como ele é rápido. Em um piscar de olhos, está quase em cima de mim, saltando no ar, se preparando para aterrissar em mim. Se eu não sair logo do caminho, serei esmagada.
No último segundo, rolo e apenas consigo evadi-lo enquanto ele aterrissa com força do meu lado, chacoalhando o chão tão intensamente que me manda pelos ares.
Eu saio rodando e continuo até chegar ao outro lado do ringue. Apresso-me a ficar em pé enquanto Sumô também se levanta. Ficamos em lados opostos do ringue, se encarando, cada um respirando, ofegantes. A plateia vai à loucura. Não acredito que ainda estou viva.
Ele está se preparando para atacar e percebo que estou sem opções. Não há muitos lugares para fugir neste ringue, ainda mais com um homem deste tamanho. Um movimento errado e eu já era. Tive sorte com o elemento surpresa. Mas, agora, eu realmente preciso lutar.
De repente, algo cai do céu. Olho para cima e vejo que alguma coisa foi jogada do teto aberto da jaula. Ela cai com um baque no chão entre nós. É uma arma. Um enorme machado de batalha. Nunca esperaria por isso. Acredito que seja o jeito de eles manterem suas competições equilibradas, prolongando seu entretenimento. O machado está no meio, equidistante de nós dois, há uns nove metros de distância.
Eu não hesito. Corro para pegá-lo e fico aliviada ao ver que sou mais rápida que ele. Chego antes.
Mas ele é mais veloz do que eu imagino e, assim que eu me inclino e pego o martelo, sinto suas enormes mãos em volta de minhas costelas, me apertando por trás em um enorme abraço de urso. Ele me levanta no alto, sem esforço, como se eu fosse um inseto. A plateia ruge.
Ele me espreme mais e mais forte e eu sinto que o ar foi tirado de mim, sinto que cada uma de minhas costelas irá se partir. Consigo segurar o machado – mas não é muito útil. Sequer consigo mover meus ombros.
Ele me gira, se divertindo comigo. A plateia reage, gritando de deleite. Se ao menos eu pudesse libertar meus braços, manusear o machucado.
Mas eu não consigo. Sinto o ar deixando meu corpo. Em mais um minuto ou dois, estarei sufocada.
Minha sorte se esgotou.