Kitabı oku: «Razão Para Matar », sayfa 2

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CAPÍTULO DOIS

- Como foi? – Perguntou Ramirez, assim que Avery saiu do escritório.

Ela baixou a cabeça e seguiu caminhando. Avery odiava conversinhas, e ela não acreditava que nenhum de seus colegas poderia conversar sem ao menos um insulto.

- Pra onde nós vamos? - Ela respondeu.

- Assuntos profissionais. – Ramirez sorriu. - Bom saber. Ok, Black. Há uma garota morta em um banco no Lederman Park, perto do rio. É uma área com muito movimento. Nem de longe o melhor lugar para se deixar um corpo.

Alguns agentes cumprimentaram Ramirez.

- Pega ela, tigrão!

- Quebra ela no meio, Ramirez.

Avery sacudiu a cabeça. Bacana.

Ramirez levantou suas mãos.

- Não fui eu.

- São todos vocês – Avery retrucou. - Nunca pensei que uma estação policial fosse ser pior do que um escritório de advocacia. Clube secreto dos bolinhas, certo? Garotas não são bem-vindas?

- Menos, Black.

Ela seguiu em direção aos elevadores. Alguns agentes celebraram por terem conseguido irritá-la. Geralmente, Avery conseguia ignorar os insultos, mas algo neste novo caso tinha mexido com ela mais do que o normal. As palavras usadas pelo capitão não eram típicas de um simples homicídio: Não sabem o que fazer. Um cenário produzido.

Além disso, o ar indiferente e arrogante de seu novo parceiro não era exatamente confortante: parece resolvido. Nada é fácil assim, nunca.

A porta do elevador estava para fechar quando Ramirez colocou suas mãos para dentro.

- Desculpe, ok?

Ele parecia sincero. Mão estendida, um olhar de desculpas nos seus olhos negros. Um botão pressionado e eles desceram.

Avery olhou para ele.

- O capitão disse que você era o único que queria trabalhar comigo. Por quê?

- Você é Avery Black – ele respondeu, como se a resposta fosse óbvia. – Como eu poderia não estar curioso? Ninguém te conhece de verdade, mas todo mundo parece ter uma opinião: idiota ou gênia, decadente ou em ascensão, assassina ou salvadora. Eu quero separar os fatos da ficção.

- Por que você se importa?

Ramirez deu um sorriso enigmático.

Mas não disse nada.

* * *

Avery seguiu Ramirez enquanto ele caminhava calmamente pelo estacionamento. Ele não usava gravata e seus dois botões de cima estavam abertos.

- Estou logo ali – ele apontou.

Eles passaram por alguns agentes uniformizados que pareciam conhecê-lo. Um deles o cumprimentou e o lançou um olhar estranho que parecia perguntar: O que você está fazendo com ela?

Ele a levou até um Cadilac carmim, velho e empoeirado, com bancos em caramelo rasgados.

- Boa carona – brincou Avery.

- Esse garotão já me salvou muitas vezes – respondeu Ramirez com orgulho, batendo de leve no capô. – Tudo o que tenho que fazer é me vestir como um cafetão ou um espanhol faminto e ninguém nem percebe minha presença.

Eles saíram do estacionamento.

O Lederman Park estava a apenas alguns quilômetros da estação de polícia. Eles seguiram sentido oeste pela Cambridge Street e pagaram a direita em Blossom.

- Então – disse Ramirez – Ouvi dizer que você já foi advogada.

- Mesmo? – Os olhos azuis o miraram de relance. – O que mais você ouviu?

- Advogada de defesa criminal – ele completou. – A melhor das melhores. Você trabalhou na Goldfinch & Seymour. Não é pra qualquer um. O que te fez sair?

- Você não sabe?

- Eu sei que você defendeu muitos crápulas. Nunca perdeu, certo? Você inclusive colocou alguns policiais sujos atrás das grades. Deve ter vivido a vida. Salário enorme, sucesso interminável. Que tipo de pessoa deixa tudo para trás para entrar na polícia?

Avery lembrou a casa em que ela cresceu, uma pequena fazendo cercada de terras vazias por quilômetros. O isolamento nunca foi para ela. Nem os animais ou cheiro do lugar: fezes, pelos e penas. Desde o começo ela queria sair de lá. E saiu. Para Boston. Primeiro para a universidade, depois para os estudos e carreira no direito.

E agora isso.

Deixou escapar um suspiro.

- Vamos dizer que algumas coisas não saem como planejamos.

- O que você quer dizer?

Em sua mente, ela viu aquele sorriso de novo. Aquele sorriso antigo e sinistro, daquele homem enrugado com óculos de lentes grossas. Ele parecera tão sincero no começo, tão humilde, inteligente e honesto. Todos eles pareciam, pensou.

Até quando os julgamentos terminavam, eles voltavam para suas rotinas e ela era forçada a aceitar que não era nenhuma heroína dos desamparados, defensora das pessoas, mas sim um peão, um simples peão em um jogo muito complexo e enraizado para ser modificado.

- A vida é difícil – divagou. “Você acha que sabe algo em um dia e, no outro, o jogo vira de cabeça para baixo e tudo muda.

Ramirez assentiu.

- Howard Randall – disse ele, claramente percebendo do que ela estava falando.

Aquele nome a deixou mais consciente de tudo. O ar puro no carro, sua posição no banco, a localização deles na cidade. Ninguém tinha dito aquele nome em voz alta por muito tempo, especialmente para ela. Avery se sentiu exposta e vulnerável, contraindo o corpo e se ajeitando no banco em resposta.

- Desculpe – disse Ramirez. – Eu não quis—

- Tudo bem – ela respondeu.

Mas não estava tudo bem. Tudo tinha desmoronado depois dele. Sua vida. Seu trabalho. Sua sanidade. Ser uma advogada de defesa tinha sido um desafio, para dizer o mínimo, mas ele era quem deveria ter deixado tudo certo novamente. Um professor gênio de Harvard, respeitado por todos, simples e gentil, tinha sido acusado de assassinato. A salvação de Avery deveria vir através da defesa dele. Dessa vez, ela poderia fazer o que sonhou desde criança: defender o inocente e garantir que a justiça prevalecesse.

Mas nada daquilo acontecera.

CAPÍTULO TRÊS

O parque já tinha sido fechado para o público.

Dois policiais à paisana viram o carro de Ramirez e rapidamente acenaram para que eles não estacionassem no pátio principal, e sim mais à esquerda. Entre os agentes que obviamente eram de seu departamento, Avery viu alguns policiais do estado.

- O que eles estão fazendo aqui? - Perguntou.

- A sede deles fica aqui na rua.

Ramirez estacionou próximo a uma fila de carros de polícia. Uma fita amarela havia isolado uma boa parte do terreno. Vans de imprensa, repórteres, câmeras e populares se aglomeravam atrás da fita para tentar ver o que estava acontecendo.

- Ninguém passa daqui - disse um policial.

- Esquadrão de Homicídios – disse Black. Foi a primeira vez em que ela se deu conta de seu novo cargo, e se sentiu orgulhosa por isso.

- Onde está Connelly? – Perguntou Ramirez.

Um oficial apontou em direção às árvores.

Eles caminharam pela grama, um pedaço de um campo de beisebol, à esquerda. Encontraram mais fita amarela antes de chegar às árvores. Debaixo da folhagem espessa havia um caminho que ladeava o rio Charles. Um policial, um perito e uma fotógrafa estavam em pé, ao redor de um banco.

Avery evitou contato com aqueles que já estavam no local. Com o passar dos anos, ela havia aprendido que interações sociais atrapalhavam seu foco, e muitas perguntas e formalidades com outras pessoas atrapalhavam seu ponto de vista. Infelizmente, essa era outra de suas características que tinha despertado o desprezo de todos no departamento.

A vítima era uma jovem colocada no banco em posição diagonal. Obviamente ela estava morta, mas não fosse a cor da pele, a posição e a expressão facial poderiam ter feito a maioria das pessoas que passaram por ali ter que olhar duas vezes para perceberem que algo estava errado.

Como uma apaixonada esperando seu amado, as mãos da garota estavam na parte de trás do banco. Seu queixo descansava em suas mãos. Um sorriso malicioso nos lábios. Seu corpo estava virado, como se ela estivesse sentada e se movido para olhar para alguém ou para respirar fundo. Ela vestia um vestido de verão amarelo e sandálias brancas, com um lindo cabelo ruivo caindo sobre seu ombro esquerdo. Suas pernas estavam cruzadas e os dedos dos pés descansavam sutilmente no chão.

Apenas o olhar de vítima entregava seu tormento. Eles emanavam dor e descrença. Avery ouviu uma voz em sua mente, a voz do velho homem que assombrava suas noites e seus dias também. Sobre suas próprias vítimas, certa vez ele a havia perguntado: O que elas são? Coisas sem nome, sem face, poucas em meio a bilhões, esperando para encontrar suas razões.

Seu corpo se encheu de raiva. Raiva por ter sido exposta e humilhada e, acima de tudo, por ter tido toda sua vida destruída.

Ela se aproximou do corpo.

Como advogada, ela havia sido obrigada a examinar incontáveis perícias e fotos de legistas e qualquer coisa relacionada a seus casos. Como policial, seu conhecimento havia aumentado muito, já que rotineiramente analisava vítimas de assassinato pessoalmente, podendo fazer avaliações muito mais precisas.

O vestido, notou, tinha sido lavado, assim como o cabelo da vítima. As unhas dos pés e das mãos estavam bem feitas, e quando chegou bem perto da pele, sentiu cheiro de coco e mel, com apenas um leve toque de formol.

- Você vai beijá-la ou o que? – Alguém disse.

Avery estava inclinada sobre o corpo da vítima, com as mãos em suas costas. No banco, um letreiro amarelo com o número 4. Além disso, na cintura da garota, havia cabelos crespos e alaranjados, quase imperceptíveis pelo vestido amarelo.

O Supervisor de Homicídios Dylan Connelly estava em pé, com as mãos no quadril, esperando por uma resposta. Ele era áspero e durão, com cabelos loiros ondulados e olhos azuis penetrantes. Seu peito e seus braços quase saíam de sua camiseta azul. Suas calças eram de linho, marrom, e os sapatos pretos e grossos. Avery já tinha o visto várias vezes no escritório. Ele não era exatamente o tipo dela, mas tinha uma ferocidade animal que ela admirava.

- Esta é a cena de um crime, Black. Da próxima vez, veja por onde você está andando. Você tem sorte que nós já buscamos as pegadas e impressões digitais.

Ela olhou para baixo, confusa. Havia tomado cuidado por onde pisara. Black olhou para os Connelly, viu seu olhar determinado e percebeu que ele estava apenas encontrando uma desculpa para reprová-la.

- Eu não sabia que isso era a cena de um crime – ela disse. – Obrigada por me lembrar.

Ramirez riu em silêncio.

Connelly mordeu a língua e deu um passo a frente.

- Você sabe por que as pessoas não te suportam, Black? Não é apenas porque você veio do outro lado. É porque quando você estava do outro lado, você não respeitava os policiais, e agora que você está aqui dentro, você respeita menos ainda. Vou ser bem claro: eu não gosto de você, eu não confio em você, e com toda certeza eu não queria você na minha equipe.

Ele virou-se para Ramirez.

- Diga a ela o que nós sabemos. Estou indo pra casa tomar um banho. Estou cansado – disse. Retirou as luvas e as jogou no chão. Para Avery, acrescentou. – Espero um relatório completo até o fim do dia. Cinco em ponto. Sala de conferências. Você me escutou? Não se atrase. E limpe essa bagunça antes de sair também. Os agentes do estado foram gentis o suficiente para nos deixar trabalhar aqui. Seja gentil o suficiente para ao menos ser cortês com eles.

Connelly saiu, com raiva.

- Você sabe lidar com as pessoas – comentou Ramirez.

Avery deu de ombros.

A legista naquele caso era uma americana de origem africana, jovem e em forma, chamada Randy Johnson. Ela tinha olhos grandes e seu cabelo curto e com dreadlocks estava coberto apenas parcialmente pelo boné branco.

Avery já havia trabalhado com ela antes. Elas tiveram um contato rápido durante um caso de violência doméstica. A última vez em que tinham visto uma a outra tinha sido após alguns drinks.

Animada por estar em mais um caso com Avery, Randy estendeu a mão, se deu conta de que estava de luva e, envergonhada, aos risos, disse:

- Oops! Eu posso estar contaminada.

- Bom te ver, Randy.

- Parabéns por entrar no Esquadrão de Homicídios – Randy disse. – Subindo na vida.

- Uma coisa por vez. O que nós temos?

- Eu diria que alguém estava apaixonado – respondeu Randy. – Limparam ela muito bem. Abriram pelas costas, drenaram o corpo, colocaram formol para não apodrecer e costuraram novamente. Roupas novas. Manicure. Cuidado total. Sem impressões digitais por enquanto. Não posso dizer muita coisa até chegar ao laboratório. Só consegui encontrar dois ferimentos. Consegue ver a boca? Você pode fazer isso por dentro, ou usar um gel para fazer um cadáver sorrir assim. Por esse ferimento de perfuração aqui – ela apontou para o canto do lábio – eu diria injeção. Tem outro aqui. – Apontou para o pescoço. – Pela coloração, esse foi feito primeiro, talvez na hora da abdução. Esse corpo está morto por aproximadamente 48 horas. Encontrei alguns cabelos intrigantes.

- Há quanto tempo ela está aqui?

- Ciclistas a encontraram às seis. – Ramirez respondeu. – O parque é vigiado todas as noites por volta da meia-noite e três da manhã. Ninguém viu nada.

Avery não conseguiu parar de olhar os olhos da garota morta. Eles pareciam olhar para algo distante, mas ainda assim perto da costa, daquele lado do rio. Ela cuidadosamente foi até atrás do banco e tentou seguir a linha do olhar. Após o rio, havia muitos prédios de tijolo. Um deles era pequeno, com uma cúpula branca no topo.

- Que prédio é aquele? – Perguntou. – O grande com a cúpula?

Ramirez analisou.

- Talvez o Cinema Omni?

- Podemos descobrir o que está em cartaz?

- Por que?

- Não sei. Só um pressentimento.

Avery se levantou.

- Nós sabemos quem é ela?

- Sim – Ramirez respondeu e checou suas anotações. – Acreditamos que o nome dela é Cindy Jenkins. Veterana de Harvard. Da irmandade. Kappa Kappa Gamma. Desapareceu duas noites atrás. A guarda do campus e os policiais de Cambridge divulgaram a foto dela ontem à noite. O pessoal do Connelly analisou as fotos e descobriu. Ainda precisamos da confirmação. Vou ligar para a família.

- Como está a nossa busca por imagens?

- Jones e Thompson estão trabalhando nisso agora. Você os conhece, certo? Detetives excelentes. Eles estão conosco hoje. Depois disso, estamos por conta própria a não ser que provemos que precisamos de recursos extras. Não há câmeras na entrada do parque, mas há algumas na estrada e pela rua. Teremos algo hoje à tarde.

- Alguma testemunha?

- Até agora não. Os ciclistas são inocentes. Posso vasculhar.

Avery analisou a área isolada. A fita amarela cobria uma grande parte do parque. Nada extraordinário podia ser visto perto do rio, do caminho dos ciclistas ou da grama. Ela tentou criar uma imagem mental do que tinha acontecido. Ele devia ter dirigido pela estrada principal, estacionado perto da água para ter acesso fácil ao banco. Como ele colocou o corpo no banco sem nenhuma suspeita?

Pessoas poderiam ter visto. Ele tinha que estar preparado para aquilo. Talvez ele fez parecer como se ela estivesse viva? Avery olhou novamente para o corpo. Definitivamente essa era uma possibilidade. A garota era linda, mesmo morta. Obviamente ele havia passado muito tempo planejando para ter certeza de que ela parecesse perfeita. Não tinha sido uma gangue de assassinos, ela se deu conta. Nem um apaixonado desprezado. Era diferente. Avery tinha visto isso antes.

De repente, ela pensou que O’Malley poderia estar certo. Talvez ela não estivesse pronta.

- Posso pegar seu carro emprestado? – Ela pediu.

Ramirez levantou a sobrancelha.

- E a cena do crime?

- Você é um bom garoto. Descubra.

- Onde você vai?

- Harvard.

CAPÍTULO QUATRO

Ele estava sentado em um escritório em um cubículo. Superior, vitorioso, mais poderoso do que qualquer pessoa no planeta. A tela do computador estava aberta a sua frente. Com um suspiro profundo, fechou os olhos e relembrou.

Recordou do profundo porão de sua casa, que mais parecia um viveiro. Muitas variedades de flores alinhadas na sala principal: vermelhas, amarelas e brancas. Muitas outras plantas psicodélicas, cada uma conseguida através de incontáveis anos, estavam em grandes calhas. Algumas eram estranhas e intrigantes, outras tinham uma aparência mais comum, que teriam sido ignoradas em qualquer cenário selvagem, apesar de suas potentes habilidades. Um sistema de irrigação automático, um medidor de temperatura e luzes de LED mantinham as plantas crescendo.

Um grande corredor feito de vigas de madeira levava às outras salas. Nas paredes, fotos. A maioria de animais em vários estágios de morte, e depois “renascidos”, preenchidos e devidamente posicionados. Um gato malhado, apoiado nas patas traseiras, brincando com um novelo. Um cachorro com pintas, rolando e esperando por um carinho na barriga.

Depois lembrou das portas. Ele imaginou a porta da esquerda aberta. Lá, ele a viu novamente, seu corpo nu deitado na mesa prateada. Luzes fluorescentes fortes iluminavam o lugar. Em um case de vidro, várias jarras limpas com líquidos coloridos.

Ele sentiu a pele dela quando esfregou seus dedos por sua coxa. Mentalmente, reencenou cada um dos delicados procedimentos: a drenagem, preservação, limpeza e preenchimento do corpo. Durante o “renascimento”, tirou fotos que mais tarde estariam estampadas nas paredes guardadas para seus troféus humanos. Algumas das fotos já tinham sido colocadas.

Uma energia tremenda e surreal emergia de si.

Durante anos, ele havia evitado humanos. Eles são sinistros, mais violentos e incontroláveis do que animais. Ele amava animais. Humanos, por outro lado, ele havia descoberto serem sacrifícios mais potentes para o Espírito Maior. Após a morte da garota, tinha visto o céu aberto, e a imagem sombria do Grande Criador o havia olhado e dito: Mais.

Sua reverência foi interrompida por uma voz estridente.

- Você está sonhando acordado de novo?

Um outro funcionário estava em pé, atrás dele, resmungando com cara feia. Tinha cara e corpo de um ex-jogador de futebol. O terno azul não ajudava muito a diminuir sua ferocidade.

Devagar, ele abaixou sua cabeça. Seus ombros foram se curvando, e ele se transformou em um mero trabalhador, desprezível.

- Desculpe, Senhor Peet.

- Estou cansado das suas desculpas. Me dê aquelas figuras.

Por dentro, o assassino sorria como um gigante gargalhando. No trabalho, o jogo era quase tão animado quanto sua vida privada. Ninguém sabia quão especial ele era, quão dedicado e essencial para o delicado balanço do universo. Nenhum deles iria receber um lugar honorável no reino do Mundo Superior. O dia a dia deles, mundano, tarefas terrenas: vestir-se, ir a reuniões, mandar dinheiro de um lado a outro. Tudo sem sentido. Só fazia sentido para ele porque o conectava ao outro mundo e o permitia fazer o trabalho do Senhor.

O comandante resmungou e saiu.

Com os olhos ainda fechados, o assassino imaginou seu Senhor Supremo: a criatura sombria e tenebrosa que sussurrava em seus sonhos e diretamente em seus pensamentos.

Um som em reverência saiu de seus lábios, e ele cantou, sussurrando: “Oh senhor, oh senhor, nosso trabalho é puro. Peça-me e eu lhe darei mais.”

Mais.

CAPÍTULO CINCO

Avery já tinha um nome: Cindy Jenkins. Ela conhecia a irmandade: Kappa Kappa Gamma. E tinha total conhecimento sobre a Universidade de Harvard. A Liga das Heras havia a rejeitado como caloura, mas ainda assim ela tinha encontrado uma maneira de viver a vida de Harvard durante seu tempo na faculdade, namorando dois caras de lá.

Diferente de outras universidades, as irmandades e fraternidades de Harvard não eram oficialmente reconhecidas. Não existiam casas gregas dentro ou fora do campus. As festas, no entanto, aconteciam regularmente em casas ou apartamentos fora do campus, sob o nome de “organizações” ou “clubes” especiais. Avery tinha testemunhado in loco o paradoxo da vida universitária durante seu tempo na faculdade. Todos pretendiam estar somente focados nas notas até o anoitecer, quando se transformavam em animais selvagens, sedentos por festas.

Enquanto esperava em um semáforo, Avery fez uma busca rápida na internet e descobriu que a Kappa Kappa Gamma tinha duas áreas alugadas na mesma quadra de Cambridge: a Church Street. Um dos locais era para eventos, enquanto o outro para reuniões e encontros sociais.

Ela passou pela ponte Longfellow, antiga MIT, e pegou à direita na Massachusetts Avenue. Logo, ela viu Harvard à sua direita, com seus incríveis prédios de tijolos vermelhos entre árvores e ruas asfaltadas.

Havia uma vaga para estacionar na Church Street.

Avery estacionou, fechou a porta do carro, e olhou para o sol. Era um dia quente, com temperaturas acima dos 25 graus. Ela olhou as horas: dez e meia.

O prédio da Kappa era uma estrutura longa, de dois andares, com fachada de tijolos. No primeiro piso, havia algumas lojas de roupa. O segundo, Avery imaginou, estava reservado para escritórios e para os negócios da irmandade. O único símbolo no interfone para o segundo andar era a flor-de-lis azul, símbolo de Harvard. Ela pressionou o botão.

Uma voz feminina arranhada saiu do interfone.

- Olá?

- Polícia – respondeu. – Abra.

Um momento de silêncio.

- Sério – a voz respondeu. – Quem é?

- É a polícia. – Disse com a voz séria. – Está tudo bem. Ninguém está em apuros. Só preciso falar com alguém da Kappa Kappa Gamma.

A porta se abriu.

Ao fim dos degraus, Avery foi recebida por uma garota cansada, com cara de sono, em um suéter cinza e calça de moletom branca. Com cabelos negros, ela parecia ter vindo de uma festa. Os cabelos cobriam boa parte de seu rosto. Havia círculos pretos abaixo de seus olhos, e o corpo do qual ela normalmente se orgulharia em mostrar parecia fora de forma.

- O que você quer? – ela perguntou.

- Fique calma - respondeu Avery. – Isso não tem nada a ver com a irmandade. Só estou aqui para fazer algumas perguntas.

- Posso ver sua identificação?

Avery mostrou seu distintivo.

Ela analisou Avery, viu o distintivo, e recuou.

O espaço da Kappa Kappa Gamma era grande e iluminado. O teto era alto. Alguns confortáveis sofás marrons e pufes azuis preenchiam o lugar. As paredes eram azul-escuras. Havia um bar, um sistema de som e uma TV de tela plana enorme. As janelas chegavam quase ao teto. Na rua, Avery podia enxergar o topo de outro pequeno complexo de apartamentos, depois o céu. Algumas nuvens apareceram.

Ela imaginou que seu tempo na faculdade tinha sido muito diferente da maioria das garotas da Kappa Kappa Gamma. Para começar, ela tinha pago por seu próprio estudo. Todo dia depois das aulas ela ia até um escritório de advocacia e trabalhava muito, primeiro como secretária, até chegar a honorável posição de assistente jurídica. Ela raramente bebia. Seu pai tinha sido alcoólatra. Na maioria das festas da faculdade, ela era a motorista da rodada ou ficava no dormitório estudando.

Uma esperança repentina apareceu no rosto da garota.

- É sobre Cindy? – ela perguntou.

- Cindy era sua amiga?

- Sim, minha melhor amiga. – disse. – Por favor, me diga que está tudo bem com ela!

- Qual seu nome?

- Rachel Strauss.

- Foi você que ligou para a polícia?

- Sim. Cindy saiu da nossa festa muito bêbada sábado à noite. Ninguém viu ela desde então. Ela não é desse tipo. – Ela virou os olhos para cima e deu um pequeno sorriso, quando completou. – Geralmente ela era bem previsível. Ela era a Senhorita Perfeita, sabe? Sempre ia para a cama na mesma hora, mesma rotina, nunca mudava, já fazia uns cinco anos. Sábado ela estava louca. Bebendo. Dançando. Saiu de si por alguns momentos. Foi legal de ver.

Rachel olhou para o nada por um momento.

- Ela estava apenas feliz, sabe?

- Alguma razão especial? – Avery perguntou.

- Eu não sei. A melhor da turma, um emprego garantido para o outono.

- Que emprego?

- Devante? Eles são, tipo, o melhor escritório de Boston. Ela seria contadora júnior. Chato, eu sei, mas ela era uma gênia quando o assunto era números.

- Você pode me falar sobre sábado?

Os olhos de Rachel se encheram de lágrimas.

- Você está aqui por causa dela, né?

- Sim - disse Avery. – Podemos sentar?

Rachel sentou no sofá e começou a chorar.

Com dificuldades, tentou falar.

- Ela está bem? Onde ela está?

Essa era a parte do trabalho que Avery mais odiava. Falar com parentes e amigos. Havia pouca coisa que ela poderia dizer. Quanto mais as pessoas ficavam sabendo sobre um caso, mais elas falavam, e a conversa deveria ajudar a encontrar os criminosos. Mas ninguém entendia isso, ou se importava com isso naquele momento. Tudo o que essas pessoas queriam eram respostas.

Avery sentou-se ao dela.

- Nós agradecemos muito você ter ligado – disse. – Você fez a coisa certa. Mas infelizmente não posso falar sobre uma investigação em andamento. O que posso dizer é que eu estou fazendo tudo o que eu posso para descobrir o que aconteceu com Cindy naquela noite. Eu não posso fazer isso sozinha, eu preciso da sua ajuda.

Rachel assentiu e enxugou as lágrimas.

- Eu posso ajudar - ela disse. – Eu ajudo.

- Eu gostaria de saber tudo o que você lembra daquela noite e de Cindy. Com quem ela estava falando? Tem alguma coisa na sua mente? Comentários que ela fez? Pessoas interessadas nela? Algo sobre quando ela saiu da festa?

Rachel desmoronou completamente.

Momentos depois, ela levantou as mãos, assentiu e se recompôs.

- Sim - ela disse. – Com certeza.

- Onde está o resto das pessoas daqui? – Avery perguntou para distrair. – Achei que as casas da irmandade estariam cheias com garotas Kappa de ressaca.

- Elas estão em aula. – Rachel disse, enxugando os olhos novamente. – Algumas foram tomar café da manhã. A propósito - acrescentou – tecnicamente nós não somos uma irmandade. Esse é só um lugar que alugamos para ficar quando não queremos voltar para nossos dormitórios. Cindy nunca ficou aqui. Muita modernidade para ela. Ela era mais caseira.

- Onde ela morava?

- Em uma casa de estudantes perto daqui. – disse Rachel – Mas ela não estava indo para casa sábado à noite. Ela ia encontrar com o namorado.

Avery apurou os sentidos.

- Namorado?

Rachel assentiu.

- Winston Graves, veterano de longa data, remador, um imbecil. Ninguém nunca entendeu porque ela namorava ele. Bom, acho que eu sei na verdade. Ele é lindo e tem muito dinheiro. Cindy nunca teve dinheiro. Eu acho que quando você nunca teve dinheiro, isso é algo atraente.

Sim, Avery pensou, eu sei. Ela lembrou de como o dinheiro, o prestígio e o poder de seu antigo escritório de advocacia tinham feito com que ela acreditasse que era diferente da jovem assustada e determinada que havia saído de Ohio.

- Onde Winston mora? – Perguntou.

- Em Winthrop Square. É bem perto daqui. Mas Cindy não chegou até lá. Winston veio no domingo de manhã procurando por ela. Ele pensou que ela tinha apenas esquecido do que eles combinaram e tinha dormido. Então nós fomos até a casa dela juntos e ela também não estava lá. Foi quando eu liguei para a polícia.

- Ela pode ter ido para outro lugar?

- Nunca – disse Raquel. – Não é o tipo dela.

- Então quando ela saiu daqui você tinha certeza que ela estava indo para a casa do Winston.

- Com certeza.

- Alguma coisa pode ter mudado os planos dela? Algo que aconteceu naquela noite, mais cedo?

Rachel balançou a cabeça.

- Não. Bem… - ela lembrou – houve algo. Tenho certeza que não é nada de mais, mas havia um garoto que gostava da Cindy há anos. O nome dele é George Fine. Ele é lindo, solitário, mas um pouco estranho, se você me entende. Malha e corre muito pelo campus. Eu tive aulas com ele uma vez ano passado. Uma de nossas brincadeiras é que todo semestre ele estava em pelo menos uma aula com Cindy, desde o ano de calouro. Ela era obcecado por ela. Ele estava aqui sábado, e o mais louco é que Cindy dançou com ele, e eles até se beijaram. Totalmente estranho em se tratando de Cindy. Quero dizer, por ela estar namorando Winston. Não que eles tinham um namoro perfeito. Mas ela estava muito bêbada, e com raiva. Eles dançaram, se beijaram, e depois ela foi embora.

- George a seguiu?

- Eu não sei – ela disse. Sinceramente, eu não lembro de te visto ele seguindo Cindy, mas pode ser porque eu estava totalmente bêbada.

- Você lembra a que horas ela foi embora?

- Sim - ela disse – exatamente quinze para as três. Sábado era nossa festa anual de Primeiro de Abril, e nós iríamos fazer uma pegadinha, mas todo mundo estava se divertindo tanto que nós esquecemos disso até a hora que Cindy saiu.

Rachel baixou sua cabeça. Um vazio tomou conta do lugar por um instante.

- Bom, veja - disse Avery – isso pode ser de grande ajuda. Obrigado. Aqui está meu cartão. Se você lembrar de mais alguma coisa, ou se as garotas da irmandade tiverem algo para contar, eu gostaria muito de saber. Essa é uma investigação aberta, então até o menor detalhe pode nos ajudar.

Rachel a olhou com lágrimas nos olhos. As lágrimas começaram a cair por seu rosto, mas sua voz se manteve calma e estável.

- Ela está morta, não está?

- Rachel, eu não posso…

Rachel assentiu, e depois cobriu o rosto com as mãos, completamente destruída. Avery chegou perto e a abraçou forte.

Yaş sınırı:
16+
Litres'teki yayın tarihi:
10 ekim 2019
Hacim:
231 s. 2 illüstrasyon
ISBN:
9781632919564
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