Kitap dosya olarak indirilemez ancak uygulamamız üzerinden veya online olarak web sitemizden okunabilir.
Kitabı oku: «Descobrimento das Filippinas pelo navegador portuguez Fernão de Magalhães», sayfa 5
XIV
Perdida a esperança de reunir á frota a caravella Santo Antonio, continuou Magalhães a viagem pelo estreito descobrindo a sudueste o cabo, hoje denominado pelos inglezes cabo Froward, mas a que os hespanhoes chamaram de Santa Agueda. A latitude austral d'este cabo foi marcada pelos navegantes em 50° 40'. O capitão King marcou depois a latitude do mesmo cabo em 53° 43', pelo, que, como nota Diego Arana, é para admirar que, com os instrumentos bastante imperfeitos de que então dispunham os navegantes, podessem fixar com tão pequenas differenças a latitude dos logares em que se encontravam, em relação ao equinoxio.
O estreito apresentava, principalmente para o sul, grande quantidade de canaes e recifes, quasi impossivel de reconhecer, nas precarias condições em que os navegantes se encontravam, extenuados da longa viagem que traziam, abatidos pelas doenças e pelos trabalhos, desanimados, vivendo mais da esperança que animava o seu chefe que da propria convicção de chegarem a bom fim.
Fernão de Magalhães conhecia perfeitamente este estado, e quanto tinha a recear de uma sublevação da sua gente se abertamente se negasse a acompanhal-o. O que acontecera com a caravella Santo Antonio podia estender-se ás outras e elle ser impotente para manter a disciplina. De quanta prudencia e tacto precisava para, quasi ao vêr coroados tantos trabalhos, não se frustrar a empreza!
Quiz ainda mais uma vez consultar os capitães e pilotos da frota sobre o que se devia fazer, para, sabendo o que pensavam, lhe apresentar as razões que tinha para seguir ávante. Assim os poderia convencer melhor e desfazer os receios levantados no espirito da sua gente.
Só é conhecida a resposta que o piloto da Victoria, André de S. Martin, deu a esta consulta, e essa não foi favoravel ao proseguimento da viagem. Este piloto, que era muito entendido em cosmographia, parece que tinha seus aggravos de Magalhães, e, ou por este motivo, ou porque ia doente, e tanto que morreu depois na viagem, opinava pelo immediato regresso a Hespanha, visto que estava achado o estreito, e o proseguimento da viagem até encontrar o mar do Sul era muito arriscado, no estado em que os navios se achavam – e ainda peior a gente que os tripulava, – para resistir aos temporaes que podessem sobrevir, que decerto, atrazariam a viagem, correndo o risco de faltarem os mantimentos e todos morrerem á fome se escapassem das tormentas.
Não obstante esta opinião, porventura muito sensata, Magalhães deu suas razões para continuar a viagem, e a frota seguiu avante, mau grado da maior parte da tripulação.
A certa altura Magalhães mandou uma chalupa com gente explorar o estreito para o occidente. Não tinham ainda navegado muito, quando, approximando-se da Terra do Fogo, observaram que era cortada por grande numero de canaes, que separavam a terra formando pequenas ilhas. Seguindo por um d'esses canaes chegaram ao extremo de uma ponta de terra para além da qual se descobriu então aos olhos d'aquella gente um mar vastissimo, que devia ser, sem duvida, o mar do sul que procuravam.
É facil calcular o alvoroto que aquella descoberta produziu nos tripulantes da chalupa; voltaram presurosos a dar a nova a Magalhães, tendo gasto tres dias no reconhecimento.
Pigafetta conta que todos choraram de alegria, e em verdade não era para menos tão feliz descoberta.
Todos cobraram animo e a frota proseguindo na sua viagem chegou á tal ponta de terra, que os navegantes denominaram acertadamente Cabo Desejado.
A caravella Victoria ia na frente e, sahido o estreito, que Magalhães denominou de Todos os Santos, em razão do dia em que o tinha descoberto, destinguiu uma outra ponta de terra onde a costa se quebrava para norte e que donominaram Cabo Victoria, em honra do navio que primeiro o dobrava. Para além d'este cabo é que se estendia o grande mar do sul.
XV
Transposto o estreito a que Magalhães chamou de Todos os Santos, como ficou dito, mas que um seculo depois era já conhecido por estreito de Magalhães6 e entrada a frota no mar do Sul, estava ainda assim bem longe o termo da penosa viagem, pois que não lhe faltaram perigos e trabalhos que passar.
Não foram as tempestades que difficultaram a marcha, porque essas felizmente não assaltaram os navegantes n'aquelle mar, e tanto que estes lhe chamaram mar Pacifico, que ainda hoje conserva; mas a propria miseria em que se viam, faltos de saude e de alimentos, sem encontrarem comestiveis nem poderem fazer aguadas nas ilhas a que iam aportando, despovoadas e desprovidas das coisas necessarias á vida.
D'esta miseria nos dá boa idéa Pigafetta quando descreve, como testemunha presencial, as necessidades e apuros em que se viram os navegantes:
«Comiamos bolacha, diz Pigafetta, que estava feita em pó, cheio de gorgulhos, que lhe tinham absorvido a substancia alimentar, com um sabor acre detestavel da urina de ratos de que estava empregnado. A agua para beber era, por egual pôdre e amarga. Para não morrer de fome vimo-nos obrigados a roer o coiro que forrava a verga grande e que impedia que a madeira desgastasse os cabos; era, porém tão duro o coiro, exposto a agua, ao sol e aos ventos, que precisava estar de molho no mar quatro e cinco dias, para ficar um pouco mais macio, pondo-o depois ao lume, e assim o comiamos. Muitas vezes vimo-nos na necessidade de comermos serradura de madeira; e os ratos, tão repugnantes ao homem, chegavam a ser o alimento mais apetitoso, pagando-se até por meio ducado cada um.»
«Mas ainda não era tudo. Maior desgraça nos veio atacar, a de uma enfermidade que consistia em nos inchar as gengivas cobrindo completamente os dentes de ambas as mandibulas, a ponto de que os atacados d'aquella doença não podiam tomar nenhum alimento7. Além dos mortos, cahiram doentes vinte e cinco a trinta marinheiros, com dores nos braços, nas pernas e por outras partes do corpo, mas que emfim se curaram.
«Pela minha parte não sei dar bastantes graças a Deus, por durante este tempo e entre tantos doentes não ter tido a menor doença.»
Não bastavam, porém, tantas provações aos ousados navegadores, porque, quando pensavam encontrar os viveres e refrescos de que tanto careciam, vendo aproximarem-se de umas ilhas, em volta das quaes navegava grande quantidade de barquinhos tripulados, depararam com bandos de selvagens, que assaltando os navios, pretendiam roubar quanto podessem. Foi necessario repellil-os á viva força e disparar sobre os barcos tiros de artilheria. Só depois d'esta recepção é que os navegantes poderam entrar com elles em commercio, trocando bagatellas que levavam por alguns poucos viveres.
Depressa largou a frota d'aquellas ilhas e Magalhães as denominou ilhas dos Ladrões, com que ainda são conhecidas, chamando-se-lhe tambem ilhas Mariannas em razão das missões que n'ellas estabeleceu a rainha D. Maria Anna de Austria, mãe de Carlos II.
D'estas missões trata largamente o padre Gobien na sua Histoire des Mariannes, impressa em Paris em 1701.
XVI
Havia mais de tres mezes que Magalhães tinha atravessado o estreito com a sua frota e não podera até ali reconhecer as ilhas que encontrara.
Chegou o dia 16 de março de 1521, que era domingo de Lazaro, e com elle o descobrimento de um novo archipelago, que Magalhães denominou S. Lazaro, em razão do dia em que o descobrira.
A primeira ilha d'este archipelago era a ilha Zamal, assim denominada pelos naturaes e que tambem se encontra nos mappas com o nome de Samar, e ainda no Diario de Albo com o nome de Suluan e Yunagan, como as primeiras ilhas reconhecidas pelos castelhanos.
Foi n'este archipelago que Magalhães desembarcou com parte da sua gente, armando duas tendas para os doentes, e descansando alguns dias em terra, da penosa e longa viagem que todos traziam.
A ilha escolhida foi a Humunu a que os navegadores chamaram Aguada dos Bons Indios, por terem ali feito aguada e por seus habitantes serem doceis, quasi timoratos, pelo menos em presença dos visitantes. Com elles trocaram das bagatellas que levavam por viveres de que careciam.
Boa gente eram os indigenas d'esta ilha onde os navegantes poderam descansar alguns dias; depois do que proseguiram viagem, avistando a 27 de março outras ilhas para O. e S. O. as quaes verificaram serem tambem habitadas.
As novas ilhas denominavam-se Masavá ou Masaguá, Butuan e Calagan, comprehendidas no archipelago que Magalhães denominou de S. Lazaro e a que depois se chamaram Filippinas em homenagem ao filho de Carlos V8.
Não foi difficil aos navegantes entrarem em boas relações com os habitantes d'estas ilhas, os quaes vieram em barcos ao encontro da frota e falaram com Magalhães por meio de um interprete, que os hespanhoes levavam e que falava o malayo.
Tão bem se entenderam, que o rei da ilha de Masavá veio a bordo fazer os seus comprimentos a Magalhães, trazendo-lhe presentes, que este não quiz acceitar, na primeira entrevista, para mostrar que não o movia a cobiça, e antes presenteou o rei com mercadorias que levava.
O rei de Masavá mostrou-se muito reconhecido a Magalhães e tanto que, pedindo este para com elle trocar viveres por fazendas, o rei lhe mandou arroz e do mais que tinha recebendo tecidos de côres, que muito lhe agradaram.
Na visita que o rei fez a bordo, Magalhães mostrou-lhe as armaduras d'aço dos seus soldados, que os tornava invulneraveis aos golpes ou aos tiros das armas de fogo; fez exposição das armas que levava, mandou disparar a artilheria, o que tudo causou espanto ao rei indigena.
Isto deu motivo ao rei de Masavá para se considerar honrado com a amizade d'aquelles extrangeiros subditos de um rei christão poderoso, e por isso dispensou-lhe toda a boa hospitalidade de que dispunha, n'uma terra semi-selvagem.
A convite do rei, foi a terra Pigaffeta e outro companheiro para conhecerem do paiz em que estavam.
Conta Pigaffeta que, quando desembarcou, o rei levantou as mãos ao ceu, e se virou para os visitantes que fizeram outro tanto.
Era isto signal de boa paz e de que tinham os extrangeiros como enviados de Deus. Depois dirigiram-se para um alpendre feito de cannas, debaixo do qual estava um balangai, embarcação de uns cincoenta pés de comprido, e se sentaram á poupa com o rei. Ali foi servida carne de porco e vinho e só Pigaffeta é que se atrevia a tocar na escodella do rei quando bebia. Os da comitiva do rei estavam de pé e armados de lanças e escudos.
Apezar da falta de um interprete da lingua, intenderam-se por signaes e assim foi Pigaffeta tomando nota da significação de muitas palavras escrevendo-as no seu caderno, admirando-se todos muito de o verem escrever!
Ao fim do dia tornaram a comer carne de porco guisada e arroz, servido em grandes pratos de porcellana, beberam mais vinho por escudellas e quando acabou esta refeição, foram para o palacio do rei, que era em forma de uma grande meda de feno, coberto de folhas de platano, e subiram para os aposentos reaes por uma escada de mão.
Meia hora depois de ali estarem foi servida nova refeição de peixe assado, gengibre e vinho. N'essa occasião viu Pigaffeta o filho mais velho do rei que veiu sentar-se ao seu lado.
Esta refeição durou mais algum tempo, sendo servido mais peixe e arroz, e o companheiro de Pigaffeta bebeu tanto vinho que se embriagou.
Foi um verdadeiro dia de festa depois de tantos mezes de privações.
N'aquella noite Pigaffeta e o seu companheiro dormiram no palacio do rei ao lado do principe herdeiro, todos deitados em esteiras de cannas tendo por cabeceira almofadas de folhas d'arvores.
Era o mais a que chegavam as commodidades da vida d'aquelle povo, apesar de no paiz abundar o ouro, que facilmente se encontrava misturado com a terra, em pedaços do tamanho de nozes e de ovos.
No palacio do rei havia jarros e muitos outros objectos fabricados d'aquelle metal. O rei trazia brincos de ouro nas orelhas e os copos da sua espada tambem eram do precioso metal.
No dia seguinte o rei convidou Pigaffeta e o seu companheiro para almoçarem, mas os dois retiraram para bordo, agradecendo a boa hospitalidade, beijando n'essa occasião o rei as mãos dos visitantes ao que estes corresponderam beijando as mãos do rei.
Assim entabolaram os navegantes relações com a gente da ilha de Masavá que tão bem os recebeu, que a frota ali se demorou até 4 de abril, em que de novo se fez ao mar no proseguimento da sua derrota.
Durante o tempo, porem, que ali permaneceu passou o domingo de Paschoa e n'esse dia desembarcaram uns cincoenta homens meios armados com o respectivo commandante, e um padre para dizer missa em terra, n'um altar que se armou.
Foi grande a admiração d'aquellas gentes quando isto viram e perguntados se não professavam nenhuma religião, responderam erguendo as mãos para o ceu, como que dando a entender que reconheciam um ente supremo a que chamavam Abba.
Assistiram os reis á missa e, ao offertorio beijaram a cruz e adoraram a hostia consagrada, imitando tudo que viam fazer aos christãos.
Quando terminou a ceremonia Magalhães apresentou uma cruz grande, diante da qual todos se ajoelharam incluindo os indios, e fez entender ao regulo que aquella cruz era o estandarte que o rei christão lhe havia confiado para implantar em toda a parte que chegasse; que n'aquella terra a ia collocar no sitio mais elevado para que todo o mundo a visse e a todos desse signal de ali terem sido bem recebidos pelos naturaes, o que faria que outros que aportassem aquella ilha os tratassem bem. Que os seus habitantes deviam, todas as manhãs fazer adoração aquella cruz, por que ella era o symbolo da redempção.
O rei prometteu a Magalhães fazer o que este lhe dizia e ordenar aos indios que assim o observassem.
A docilidade d'aquella boa gente deixou captivados os navegantes e fortaleceu-lhes o animo para seguirem na sua empreza civilisadora, não concorrendo menos para augmentar a auctoridade moral de Magalhães sobre a sua gente.
XVII
É d'aqui em diante que se vai passar a tragedia mais horrivel, que enlutou a temeraria empreza de Magalhães.
A 4 de abril de 1521 largou a frota do archipelago de S. Lazaro, depois denominado das Filippinas, como já ficou dito, e dirigiu o rumo para a ilha de Zebú, que o regulo de Masavá lhe indicara como um dos portos mais importantes e mais proximos, para entrar em commercio.
Effectivamente, decorridos tres dias de viagem, avistaram uma ilha, e aproximando-se d'ella viram que era muito povoada de casas construidas sobre arvores collossaes.
Era a ilha de Zebú.
Magalhães entrou em commercio com o rei d'aquella ilha, não sem alguma difficuldade, pois que o regulo queria que os hespanhoes lhe pagassem egual tributo ao que era imposto ás embarcações das ilhas visinhas que vinham áquelle porto.
Custou a convencer o rei de que os hespanhoes não lhe pagariam tal tributo e, antes pelo contrario o exigiriam para si e lhe fariam guerra, se o rei presestisse n'essa imposição.
Trocadas explicações de parte a parte, o rei de Zebú reconheceu a inconveniencia e entrou em boa amizade com Magalhães, annuindo a dar privilegio aos hespanhoes para estabelecerem commercio na ilha, unica exigencia que faziam e direito que se reservavam.
Foram, porem, mais longe as boas relações que entabolaram com aquella gente. O rei de Zebú manifestou desejo de ser christão, depois de ouvir as façanhas praticadas por portuguezes e hespanhoes, animados da grande força moral que a religião do crucificado dava aos que observavam a sua lei.
O baptismo do rei de Zebú celebrou-se com grande aparato, e não só este rei mas muitos outros regulos ou senhores d'aquella ilha, rainhas e boa parte da população receberam a agua do baptismo.
Não se poderá affirmar que a convicção ou a fé os movesse a tão facilmente abraçarem a religião de Jesus Christo, porque de certo o espirito d'aquella gente não poderia estar preparado para comprehender toda a sublimidade do christianismo; mas sim os attrahiu a curiosidade e ainda mais a idéa de que o baptismo lhes daria mais coragem e valor para vencerem seus inimigos nas guerras que traziam com os povos vizinhos.
Sim, isto sobretudo é que os devia ter attrahido.
Viam alli gente christã que os deslumbrava com o seu poder, que elles consideravam como sobrenatural, quando a artilharia disparava tiros retumbantes, e a mosquetaria fuzilava lume pelo ar; e sem poderem ainda apreciar a grande vantagem das armaduras, contra as quaes se embotariam as suas agudas settas, pois não haviam entrado em lucta, o fogo das armas lhes bastava para os maravilhar, apesar dos christãos só terem dado descargas de polvora secca.
Dominados aquelles indigenas pelo prestigio dos christãos, foi relativamente facil a Magalhães obter d'elles quanto queria; e assim o rei de Zebú jurou solemnemente fidelidade a Carlos V, e com elle todos os senhores da ilha submissão ao imperador das Hespanhas.
Não, obstante o reconhecimento da auctoridade de Carlos V e da submissão dos habitantes da ilha de Zebú, o senhor ou rei de outra ilha proxima não approvou o procedimento dos seus vizinhos, e por isso, quando alli foram os hespanhoes, para entabolar relações, o rei negou-lhes obediencia.
Isto deu logar a uma demonstração de força dos hespanhoes, que incendiaram uma aldeia da ilha, retirando-se depois nas chalupas.
O regulo que não quizera reconhecer a auctoridade dos extrangeiros, chamava-se Silapulapú; mas outro regulo da mesma ilha, chamado Lula, mostrou-se mais docil, e tanto, que prometteu a Magalhães o mandar-lhe presentes em troca dos que d'elle recebera.
Este Lula, consciente ou inconscientemente, foi a causa da desgraça do grande navegador. Elle incitou, por assim dizer, Magalhães a fazer a guerra a Silapulapú, e se o fez de boa fé, ou de plano concertado, para dar ruina aos christãos, é o que a historia não diz, mas se poderá inferir pelo modo como Lula procedeu.
Na manhã de 26 de abril de 1521, enviou Lula um seu filho a Magalhães com duas cabras, dizendo-lhe que, se não mandava mais presentes, não era por sua culpa, mas porque Silapulapú a isso se havia opposto, persistindo em não reconhecer a auctoridade dos hespanhoes. Dizia mais o Lula que, se Magalhães lhe mandasse alguns dos seus homens de guerra, elle promettia, com a sua gente, reduzir á obediencia o Silapulapú.
Esta simples mensagem de Lula foi para Magalhães como que um repto á sua coragem e valentia.
Não se diria nunca que Fernão de Magalhães hesitava um momento quando lhe reclamavam o esforço do seu braço, a bravura do seu animo. Elle, soldado ousado, que havia ferido guerras em Africa, e que ha tanto tempo conservava a espada na bainha, sem ter ensejo de retemperar o aço da sua lamina, rechassando o inimigo; elle, a quem a aventura attrahia e povoava a sua imaginação das mais seductoras façanhas, encontrava alfim novo ensejo para experimentar se o seu braço ainda era o mesmo e se a boa estrella, que tinha guiado sempre as suas armas, mais uma vez o conduziria á victoria.
As circunstancias, porém, não se apresentavam muito favoraveis, e d'isso o quiz convencer João Serrão, homem experiente, que não se deixava fascinar pela gloria, mais que duvidosa, da temeridade d'aquelle feito.
Era preciso attender a que a gente de Magalhães estava consideravelmente reduzida: uns, tinha-os a morte levado; outros, as doenças e trabalhos da viagem os haviam impossibilitado. Os válidos eram poucos, e esses mesmos meio depauperados.
Tudo isto ponderou Serrão a Magalhães. O rei de Zebú tambem se mostrou contrario á resolução do grande capitão, apesar de não poder calcular toda a força e valentia de que os christãos poderiam dispôr, na conta em que os tinha de homens extraordinarios, por assim dizer, sobrenaturaes. Entretanto sabia que o inimigo era assaz numeroso, e pelo sentimento nato de que, contra a força não ha resistencia, elle pensava, a despeito de todas as maravilhas creadas no seu espirito, quanto era arriscada e talvez fatal para os hespanhoes a lucta que ia travar-se.
Magalhães não attendeu as razões nem os conselhos dos seus e do rei de Zebú. Costumado a mandar e a ser obedecido, tanto mais depois de ter subjugado os proprios elementos para chegar ao termo da sua empresa, nenhumas forças seriam capazes de o demover da resolução que tomára, de submetter pelas armas os habitantes da ilha de Mactan que se negavam a prestar obediencia.
O numero dos seus soldados pouco lhe importava, como pouco lhe importava se o inimigo era assás numeroso. Estava elle com o seu braço e com a sua espada costumada á guerra contra infieis. Vencera em Africa muitas vezes contra milhares de indigenas, e de que façanhas se poderia orgulhar se assim não fôra!
A sua espada e a sua fé valiam por um exercito; sob o seu commando e ao seu lado cada soldado valia por mil. Eram assim as guerras d'aquelle tempo contra os povos d'alem mar, como o tinham sido na peninsula contra os mouros; a cruz levava de vencida o crescente por toda a parte; porque não havia de triumphar tambem alli?!
Para quem com tanta firmeza e sacrificio tinha desvendado os mares procellosos, para dar a volta ao mundo, luctando tenazmente pela sua idéa, tantas vezes contrariada pelos elementos e pelos homens, que valia agora a resistencia de uns selvagens?
Muito maiores obstaculos tinha elle destruido no seu caminho, sobrando-lhe sempre animo para proseguir avante, e não podia comprehender que homens como aquelles que o acompanhavam na temeraria empresa que se propôs, que com elle tinham compartilhado dos perigos para alli chegarem, se arreceassem agora de entrar em guerra com um bando de selvagens, e medissem primeiro cautelosamente as forças para se lançarem na lucta, quando nem sabiam ao certo o numero dos inimigos nem as armas de que elles dispunham.
O rei de Zebú era suspeito para informar da quantidade e qualidade do inimigo. Quem podia affirmar o contrario?
O triumpho das armas christãs importaria a submissão completa e incondicional de todos aquelles povos, e o grande capitão não só teria coroado a sua empresa de encontrar o mar do sul, mas traria á Hespanha tributarios os povos d'aquellas regiões, fascinados e submettidos pelo prestigio das suas armas.
Era de tentar a cartada! Quem lhe poderia resistir?!
Nas cartas geographicas e livros de geographia da segunda metade do seculo XVI já o estreito vem indicado com o nome do seu descobridor, e apenas consta de um aucto lavrado por Pedro Sarmento de Gamboa, quando atravessou o estreito em perseguição do Corsario inglez Drack, elle denominou o estreito Mãe de Deus em razão dos grandes perigos que passou para o atravessar, e de que felizmente sahiu a salvo, pedindo a Filippe II de Castella que lhe conservasse aquelle nome em homenagem á Virgem que tão milagrosamente lhe acudira. Apesar d'isto Filippe II conservou ao estreito o nome do teu descobridor.
A obra de Mallot Les Philippines, publicada em Paris em 1846 não deixa duvidas a este respeito.