Kitabı oku: «O Marquez de Pombal», sayfa 4
XV
Não recuou o Marquez de Pombal, porque o julgou necessario e de maravilhoso effeito para libertar o povo, deante do cadafalso, levantado para rolarem algumas cabeças nobres.
Não tremeu o Marquez de Pombal, quando lavrou o decreto que expulsava os jesuitas; pois com tão rasgada medida não só beneficiou Portugal, mas a Europa inteira e o Novo Mundo; com este acto de sabia politica quebrava as cadeias, com que os padres da companhia amarravam as consciencias ao poste d'uma fé convencional; limpava o corpo social da lepra da superstição e do fanatismo, que rapidamente se propagava e desinvolvia, por toda a parte, aonde penetrava o morbido contagio da roupeta dos máos e falsos companheiros de Jesus!
Para alguns são estes dous factos dous grandes e execrandos crimes; para outros duas louvaveis virtudes; para nós – dura necessidade, consequencia forçada na realisação de um plano salutar e benefico.
A nobreza e o jesuitismo eram, naquella epocha, os obstaculos gigantes, que se oppunham ao estabelecimento da liberdade.
A nobreza e o jesuitismo, desherdando, espoliando o povo de tudo o que podia tornal-o livre e independente, disputando o poder, a influencia e a preponderancia monarchica, eram estorvo invencivel ao systema representativo, á adopção e reconhecimento legal das garantias constitucionaes e das prerogativas da corôa, que a philosophia politica de seculo, as necessidades do tempo e o exemplo da Inglaterra instantemente reclamavam, cujo disco luminoso começava já a brilhar nos horisontes do futuro em muitos estados da Europa, cuja triangulação havia sido habilmente traçada sobre – a inviolabilidade do rei – a responsabilidade do ministro e a soberania, do povo.
XVI
O Marquez de Pombal queria a liberdade para a patria e para o povo, como a primeira fonte de engrandecimento e prosperidade nacional.
O Marquez de Pombal não phantasiava theorias politicas nem traçava systemas philosophicos; não escrevia pungentes ironias e asperos epigrammas; não defendia e exaltava o protestantismo, para censurar e maldizer a Egreja catholica; não persuadia a revolta nem excitava os povos á pilhagem e á carnificina – concebia medidas uteis e prudentes, e executava-as conforme as circumstancias imperiosamente o exigiam.
A regeneração intima dos homens e das instituições, e não a organisação formal e superficial do systema governativo, foi o seu firme proposito, objecto constante de sua actividade e desvelo, embora para o conseguir fosse necessario dominar o rei, opprimir e desacreditar os nobres, desprestigiar e abater o clero.
Tinha por ventura o rei força, energia, firmeza de vontade, sciencia e coragem para salvar a nação e o povo e detel-o á beira do abysmo, que de dia para dia lhe cavavam profundo tantas causas de ruina?!
Seria bastante robusto o seu braço, poderoso o seu sceptro de oiro, valiosos os diamantes da sua corôa, para poupal-os ao choque revolucionario, que de perto e ao longe se presentia, e que em breve devia abalar a Europa inteira, já consideravelmente agitada pelas pulsações, que violentas se succediam no coração da França e que a faziam estremecer até ás mais affastadas extremidades?!
Qual teria sido o destino do pequeno e então pobre e humilde Portugal, se o não houvessem preparado para resistir á onda revolucionaria, que mais tarde lhe devia passar por sobre as quinas e inundar os seus castellos?!
Existiria hoje Portugal, como nacionalidade e paiz independente, se lhe não houvessem dado, annos antes, força e coragem, recursos e patriotismo, para não succumbir abatido ante as armas victoriosas do moderno Cesar, que, debaixo da forma do despotismo e da tyrannia, da invasão e da conquista, contra a sua vontade talvez, ou, melhor ainda, sem o presentir, fazia com a ponta da espada e com a bocca de seus mil canhões a propaganda liberal?!1.
XXIII
Depois da resurreição nacional, que em 1640 succedeu á morte da independencia da patria, esmagada pelo peso oppressor de estranho jugo, devida não como pretendem alguns, ás combinações grandiosas e á politica admiravel de Richelieu, mas á patriotica iniciativa e á dignidade heroica dos conspiradores populares, – a nação portugueza recobrou a sua autonomia, despedaçou as algemas de tão odiosa servidão politica, desprendeu-se, por um soberano esforço de coragem, dos braços de ferro, em que durante longo e angustioso periodo a tinham apertado os despotas castelhanos, e levantou sobre o throno de Affonso Henriques, reis, se não filhos do povo, eleitos e proclamados por elle.
Portugal entrou de novo no dominio e posse de suas conquistas; e o soberano opulento do Oriente, o descobridor generoso de ignotas plagas e de estranhas gentes, ergueu-se do tumulo, que lhe tinham aberto o arrojo pueril d'uma creança ávida de glorias vãs, e a imbecilidade trôpega d'um velho cardeal fanatizado.
Era todavia sombra magestosa d'um vulto heroico, surgindo entre as ruinas de sumptuoso edificio desmantelado!
Nem exercito, nem marinha, sem commercio, sem industria, exhaustos os cofres do estado, perdido o credito, nominal a riqueza de suas maravilhosas descobertas, vazio o thesouro de suas conquistas!.. Só com a auréola de passadas glorias; sem outro titulo perante as nações, alem da merecida gratidão, a que tinha direito pelos valiosos serviços prestados á humanidade e á religião, que o ligara ao céo e a Deus logo desde o berço!
Havia para elle a esperança no futuro firmada na lembrança do passado; existiam amontoados, sobre os mares e nas suas ricas possessões abandonadas, os despojos da sua antiga grandeza; o seu nome escripto sobre toda a extensão do Oceano, brilhando nas coroas de muitos monarchas, gravado no coração de muitas nações florescentes!
Foi por isso que todos acolheram com applauso o brado da sua independencia e lhe ajudaram a manter a liberdade, que desastrosamente havia perdido nas plagas longinquas de Alcacer Quivir e sobre o leito de um cardeal moribundo!
A coroa de ferro dos senhores de Hespanha precisava das perolas e dos diamantes de quatro mundos!..
Para cobrir a juba ensanguentada do leão de Castella eram necessarios os alvissimos arminhos do manto de nossos reis!..
A ambição insaciavel do hespanhol, não contente com as suas possessões, pretendia ainda com sôfrega cubiça usurpar as colonias portuguezas, que já se alongavam e estendiam do oriente ao occidente, do septentrião ao meio dia, sobre todos os continentes, á roda e no meio de todos os mares!..2.
XXIV
Os herdeiros da casa de Bragança, os populares soberanos eleitos pelo povo, os primeiros representantes d'essa realeza legitima, nem comprehenderam a sua elevada missão, nem lhe importaram as necessidades do seu povo, não sabendo ou não querendo aproveitar-se do amor e da confiança que nelles haviam depositado os que, resgatando o reino, lhes cingiram o diadema e lhes lançaram sobre os hombros a purpura de duas dynastias!
Não emprehenderam reformas; não traçaram plano algum de politica definida; não promoveram o desenvolvimento ou ao menos a restauração da industria, do commercio, da navegação – de todos quantos elementos constituem a vida laboriosa, o bem estar social e a prosperidade d'uma nação livre, independente e opulenta do que poderia tornal-a grande e respeitada; exhaurindo o erario, sem activar as forças da riqueza publica e particular, sem abrir novos mananciaes de producção, sem dotar o paiz de melhoramentos de reconhecida utilidade… sua unica preoccupação, todo o seu empenho limitava-se, parecia comprazer-se até, em augmentar e completar o despotismo, que estranhos para cá haviam importado, e o gosto da epocha, o exemplo d'outras côrtes, muito favoreciam, engrandecendo ao mesmo tempo os jesuitas, dando força e apoio ao tribunal da inquisição; em manter um fausto ruinoso, em propagar o amor e a paixão por um luxo, mais do que inutil, prejudicial, e por vezes e em muitas cousas insolente; em consumir improductivamente, com vaidades reaes, em sumptuosas construcções, em dispendiosas obras d'arte, e, o que é peor, em beatificas e exaggeradas piedades mundanas, capitaes immensos, sommas fabulosas!
Portugal, arrancado pela mão do povo ao jugo de Castella, é em 1703 hypothecado aos inglezes, que o exploraram, como o possuidor de má fé explora a propriedade alheia. Roma especulou tambem; a nobreza e o clero completaram este systema de legal e convencionada pilhagem!..
Os elementos corrompidos, que constituiam uma civilisação, já caduca, enferma e quasi moribunda, foram por ultimo triturados, dissolvidos pela acção candente do vulcão revolucionario, que tinha por principal reagente a liberdade.
A desaggregacão molecular, se assim é licito dizel-o, do monstruoso cadaver do feudalismo, da theocracia e da realeza absoluta, operou-se d'um modo geral e completo no violento e vigoroso impulso, que a força soberana do povo havia desenvolvido.
Familia, patriotismo, cohesão e unidade nacional e politica, religião, amor de dignidade, nobreza de sentimentos elevação de ideias, aspirações de gloria e a propria liberdade… tudo havia desapparecido, abysmando-se em completa desordem e anarchia, na immensa cratera, que a espantosa erupção revolucionaria acabava de rasgar no seio da França.
O imperio, a concentração, o despotismo, a tyrannia das armas, os estragos apparentes da conquista, as invasões ambiciosas d'um homem e do seu numeroso exercito, despertaram e desenvolveram por toda a parte uma nova força de cohesão e affinidade, para reunir os fragmentos dispersos, e dar ao corpo dilacerado consistencia e unidade por meio de um novo arranjo politico, religioso, moral e economico, que lhe assegurasse a existencia e uma vida regenerada e pura.
Do embate de duas forças contrarias, mas tendentes e susceptiveis de formar um dia o equilibrio– da acção descentralisadora da republica e da acção concentradora do imperio, devia mais uma vez resultar a harmonia!
Com a bayoneta e com a espada levava o soldado do imperio o terror e o espanto ao seio das familias nas terras, que invadia e conquistava, – era o instrumento material e automatico do despotismo.
Com a palavra, junto do lar domestico e rodeado d'essa familia, que o recebia, como inimigo e como hospede, narrava os feitos gloriosos da revolução, expunha o seu plano, traçava as suas reformas, bemdizia os seus beneficios, exaltava as suas doutrinas, applaudia o seu triumpho – era o apostolo fervoroso da liberdade, o discipulo intelligente e livre da eschola de 89.
A Constituinte tinha-lhe dominado a intelligencia e o coração; Bonaparte recrutara-lhe apenas os braços e a força muscular.
Aquella apontou-lhe para o sol da liberdade e dava-lhe como premio a emancipação: este descobriu-lhe o horisonte luminoso da gloria e promettia-lhe a corôa do vencedor.
Estas duas forças, ambas poderosas, ambas intrepidas e inflexiveis na meta, quasi sempre terminam por transigir… Se uma convence e domina, a outra seduz e arrasta; e ás vezes a razão e a consciência humilham-se ante as ambições mesquinhas dos homens… E a historia prova de sobejo que se os filhos da França amam a liberdade, prezam sobre tudo a gloria militar, o que não admira se attentarmos á poderosa influencia que sobre este povo exerceram duas raças, duas civilisações differentes – a latina e a germanica, e á sua educação guerreira.
Foi por isso que ao vulto heroico do soldado imperial seguia por toda a parte a sombra, pelo menos, do revolucionario de 89.
A liberdade!..
A liberdade, que os desventurados filhos da moderna Hespanha, os que se appellidam legitimos descendentes de arabes e godos, parece não sentirem nem conhecerem, e que muitos traiçoeiramente fingem amar, para mais facilmente a destruirem!..
Querem a liberdade que para o portuguez é a vida, que o portuguez ama e respeita, de que o portuguez é apostolo e soldado inflexivel?..
Levantem-lhe um altar e adorem-na; façam-se missionarios e propaguem-na; e, se tanto for preciso, opponham aos despotas, que os opprimem, o despotismo das revoluções.
Não clamem pelo auxilio d'aquelles que, não podendo dar-lhes essa liberdade, não querem, com uma união impossivel, perder a sua!..
Os livros sanctos fallam de um Caim e de um Abel.
Terá a historia contemporanea, um dia, de personificar nelles dous povos que se dizem tambem irmãos?!
Venha, e bem vinda seja, – a harmonia nas leis; a uniformidade nas instituições; o consorcio das litteraturas; a aproximação dos costumes; a intimidade de relações moraes e economicas: cáiam por terra essas odiosas barreiras que estorvam a liberdade de commercio entre os dois povos, e a troca de seus productos; acabe por uma vez o repugnante systema dos passaportes; entronquem-se as linhas ferreas; facilitem-se as communicações fluviaes; canalizem-se os rios communs; celebrem-se congressos scientificos e litterarios, exposições industriaes e artisticas, peninsulares; venham, numa palavra, a fraternisacão dos homens e a alliança dos governos; mas, para fortalecer a autonomia dos dois povos e garantir a liberdade de todos, – e o futuro resolverá o difficil problema, para o qual a natureza e a historia fornecem dados tão differentes e heterogeneos, que o tornam hoje absolutamente insoluvel.
Em 1866, em que pela primeira vez se traçaram estas linhas, bem se presentia já o que dous annos depois veio a succeder, e se está realisando na visinha Hespanha.
Commoções violentas denunciavam o aproximar – d'uma revolução profunda para preparar uma regeneração intima, – de um esforço gigante que devia partir os ferros a essa nação escrava da tyrannia e do fanatismo, agrilhoada (e o que é assombroso!) por alguns de seus degenerados filhos ao poste do mais affrontoso despotismo e da mais ignominiosa intolerancia politica e religiosa!
Fez-se o esforço, operou-se a revolução e com tanta maior gloria quanta maior abnegação e generosidade; caíram os tyrannos, libertaram-se os opprimidos, erigiram-se altares, levantaram-se monumentos á liberdade em muitas leis e instituições, novas ou regeneradas; mas a revolução profunda no sentimento, grandiosa na ideia, sublime nas inspirações, é, fatalmente, á hora em que escrevemos mais um desengano pungentissimo que uma illusão fagueira, antes um desalento que uma esperança.
A Hespanha parece retrogradar, em vez de progredir; olha desconfiada e como receosa para o futuro que a chama, e pesam-lhe saudades do passado, saudades de amarguras, saudades do seu longo martyrio!
Desventurada Hespanha! Para que te cortam o vôo de legitimas aspirações?
Para que sem dó arrancam no teu bello jardim de esperanças as mais formosas e promettedoras?
Para que te querem agrilhoar de novo ao poste onde te suppliciaram durante tantos seculos?
Mudança de potro, mudança de cutello, substituição de algozes… mas sempre o mesmo supplicio! sempre os mesmos instrumentos de tortura!
Mesquinha revolução, que tão pouco alcança!
Povo infeliz! quanto mais rega com lagrimas e sangue o sólo da patria, tanto mais elle se lhe desentranha em ferro para forjar grilhões; e só produz espinhos para tecer a corôa do seu prolongado martyrio!..
Povo infeliz! mal principiava a despontar a aurora da tua redempção pela liberdade, e erguem-se tenebrosas as nuvens do passado, para toldar a face ao grande astro do teu dia de gloria, projectando sombras em vez de irradiar luz!
Quando, apostolo da grande ideia, te purificavas para tomar sobre os hombros a tunica alvissima do augusto sacerdocio, prestar culto á liberdade, e entoar o hymno do progresso, que em breve deveria talvez repercutir-se em todos os angulos da Europa, – arremessam-te a mortalha destinada ao moribundo, ainda tincta no sangue das hectombes, com que a tyrannia oppressora celebrava as suas criminosas e lugubres victorias, e condemnam-te a mais alguns annos, e quem sabe se a mais alguns seculos de tormentoso martyrio!
Revolução de 1848 em França, de 1868 na Hespanha: datas gloriosas, e que apenas separam vinte annos de luctas não interrompidas; sonhadas aspirações, gratas lembranças d'esse sonho de liberdade, que valor, que importancia será a vossa na historia das nações?!
A França acordando encontra – o imperio, e a liberdade mutilada.
A Hespanha – A realeza, e a liberdade… talvez perdida.
Tremenda é a responsabilidade d'aquelles que preferem á liberdade de todos as pompas deslumbrantes, mas vãs, d'uma côrte apparatosa!..