Kitabı oku: «Flores do Campo», sayfa 2
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II. SAUDADE
Em acordando agora,
O meu contentamento
É vêr em cada aurora
Um dia de tormento!
Podesse eu dar-te a prova
Dos dias que me esperam,
Lançando-me na cova
Onde elles te pozeram!
Lançassem-me algum dia
Ao pé, que de repente
O coração te havia
De ainda pular quente…
A face cobrar logo
A fórma e côr perdida,
E a bocca toda fogo
Ah! inspirar-me a vida!
Supplíca, ó anjo! implora
Ao Pai universal
Que me deixe ir embora
D’este horroroso val
De lagrimas amargas,
E turvas de tal modo,
Como umas nuvens largas
Que tapam o céo todo!
III. ETERNIDADE
Inferno e céo, conforme
A nossa fé, confesso
Que é um mysterio enorme,
É um mysterio immenso.
Mas um mysterio é tudo:
Folhinha d’herva, e estrella,
Não ha comprehendêl-a!
É contemplal-a mudo.
E a herva, como existe,
A mim quem m’o diria,
Se a luz que me alumia
Nem sabe em que consiste?
Mas uma coisa sabe
O que a cabeça ignora
– O coração… que mora
Em peito onde não cabe.
Ha uma luz mais clara
Que a luz do pensamento:
A d’essa imagem cara…
A d’este sentimento!
IV. … 21 DE SETEMBRO
Ha uma hora ou mais,
Marina! que contemplo
A casa de teus paes
Que é para mim um templo.
Está a porta aberta,
E vejo alumiada
A parte descoberta
Da casa da entrada.
Lá andam a passar
Do quarto onde acabaste
Á casa de jantar
Os vultos, que deixaste.
Os vultos, que os vestidos
Tão negros que pozeram,
De luto, tão compridos,
Não sei que ar lhes deram!
A tua bella irmã,
A tua piedade,
A rosa da manhã,
A flôr da mocidade,
Quem lhe diria a ella,
Tão cheia de alegria,
Que haviamos de vêl-a
Assim já hoje em dia!
É esta vida um mar,
E bem se póde a gente,
Marina! comparar
A rapida corrente,
Que vai de lado a lado
Por esses valles fóra
Sem nunca lhe ser dado
Ter a menor demora.
Pára, quando a engole
Aquelle mar sem fundo;
Nem pára; é como o sol
E como todo o mundo…
Ahi não pára nada,
Tudo viaja e anda,
Que a ordem lhe foi dada,
E dada por quem manda.
Chega a corrente lá,
Engole-a logo a onda:
Depois, que é d’ella já?
A nuvem que responda.
Que a nuvem que nos passa
Pela manhã nos ares,
Era hontem a fumaça
Que andava n’esses mares;
E a nevoa, que tu vês
Nas ondas fluctuantes,
Corria-nos aos pés
Talvez um dia antes.
A agua é que no giro
Em que anda eternamente
Não deu nunca um suspiro
Em prova de que sente.
.....................
N’UM ALBUM
Pedindo-se ao author uma poesia
Não me admira a mim que o sol, monarcha
De indisputavel throno, e throno eterno
Em céo e terra e mar;
Que em seu imperio o mundo inteiro abarca
Abaixe á pobre flôr seu dôce e terno,
Mavioso olhar.
Não me admira a mim que a crystallina,
Tão pura, onda do mar, que espelha a face
Do astro creador,
Que essas asperas rochas cava e mina,
Á praia toda languida se abrace
E toda amor!
Mas sendo vós um sêr mais precioso
Do que onda e sol— um anjo de poesia
Inspirada e que inspira;
Que ás minhas mãos, das vossas, tão mimoso,
Delicado penhor descesse um dia
É que me admira.
Quizera nos meus cofres de poeta
Ter as riquezas todas do Oriente,
E com mãos liberaes
Expulsar esta duvida que inquieta
Um grato coração que apenas sente
E… nada mais!
De limpido diamante e fio de oiro,
Quizera-vos tecer collar que á aurora
Vencesse em brilho e côr;
Mas o poeta, o unico thesoiro
Que tem, ah! são as lagrimas que chora
E o seu amor.
Eu vol-o dou. E lá do espaço immenso
Se amada estrella olhar piedoso envia
A quem da terra a adora;
Se o sol aceita á flôr humilde incenso;
Ha no amor tambem muita poesia…
Minha senhora!
Evora.
* * *
Beijo na face
Pede-se e dá-se:
Dá?
Que custa um beijo?
Não tenha pejo:
Vá!
Um beijo é culpa
Que se desculpa:
Dá?
A borboleta
Beija a violeta:
Vá!
Um beijo é graça
Que a mais não passa:
Dá?
Teme que a tente?
É innocente…
Vá!
Guardo segredo,
Não tenha medo…
Vê?
Dê-me um beijinho,
Dê de mansinho,
Dê!
Como elle é dôce!
Como elle trouxe,
Flôr!
Paz a meu seio;
Saciar-me veio,
Amor!
Saciar-me? louco…
Um é tão pouco,
Flôr!
Deixa, concede
Que eu mate a sêde,
Amor!
Talvez te leve
O vento em breve,
Flôr!
A vida foge.
A vida é hoje,
Amor!
Guardo segredo;
Não tenhas medo
Pois!
Um mais na face
E a mais não passe!
Dois…
Oh! dois? piedade!
Coisas tão boas…
Vês?
Quantas pessoas
Tem a Trindade?
Tres!
Tres é a conta
Certinha e justa…
Vês?
E o que te custa?
Não sejas tonta!
Tres!
Tres, sim. Não cuides
Que te desgraças:
Vês?
Tres são as Graças,
Tres as Virtudes,
Tres.
As folhas santas
Que o lirio fecham,
Vês?
E que o não deixam
Manchar, são… quantas?
Tres!..
* * *
Thuribulo suspenso inda fluctuo,
Em quanto a alma em incenso restituo;
Mas, quando como fumo que se esvai,
Minha alma! vás teu rumo… sobe e vai.
Vai d’estas densas trevas, d’esta cruz,
Levar-lhe… quanto levas, pobre luz!
Amor, que em mim não cabe, vai depôr
Em Deus, e Deus bem sabe se era amor;
Se d’outra flôr o calix mais libei
Por esses quantos valles divaguei;
Se um nome em igneo traço li no céo,
Nas ondas e no espaço, mais que o seu…
Deus sabe se eu dos montes vi tambem
Nos vastos horisontes mais alguem;
Nos tristes e risonhos dias meus,
Se alguem vi mais em sonhos, que ella e Deus.
Porém quem é que apanha o aereo véo
Da nuvem da montanha, se é do céo?
Se á terra a nuvem desce, quando vai
Tocar-se-lhe, desfez-se como um ai.
Coimbra.
* * *
Luz d’intima influencia,
Oh fugitiva luz!
Luz cuja eterna ausencia
É minha eterna cruz.
Podessem-te, ainda antes
Do meu extremo adeus,
Meus olhos fluctuantes
Vêr lampejar nos céos.
Se ainda n’esse espaço,
Tão longe onde tu vás,
Visse um reflexo baço
Da pura luz que dás;
Tornaram-se-me estrellas
As lagrimas de dôr;
E lagrimas são ellas…
Sim, lagrimas d’amor!
Vê n’esse espaço immenso
Os astros como estão
Bem como eu estou, suspenso
Por intima attracção.
Porque ha quem os attráia;
É essa eterna paz
Que a mim de praia em praia
A suspirar me traz.
Converte-me este inferno
Em azulado céo,
Ou quebra o laço eterno
Que a tua luz me deu;
Ou antes muda em espuma
De nunca estavel mar
Esta alma que alma alguma
Póde exceder em amar.
Em cinza, em terra, em nada,
Meu sêr converte, ó luz,
Mas sempre, sempre amada,
Deliciosa cruz!
Portimão.
RESPOSTA
A A. DO QUENTAL
Em fumo se vai tudo, amigo! Olhando
Para as nuvens do céo, nuvens d’aquellas,
E parece-me ainda que mais bellas,
Anda a gente fazendo e desmanchando.
Dá-me uma saudade em me lembrando
O bello tempo que passei com ellas,
Por essa immensa abobada de estrellas,
Por esse mar de fogo viajando…
Andasse ainda eu lá, que não me havia
De vêr por estes charcos atolado,
Onde nem sol nem lua me alumia.
Andasse ainda eu lá, desenganado
Mesmo já como estou de achar um dia
A patria d’aonde ando desterrado.
* * *
Pois se o homem, se anjo e nume,
Planta e flôr,
Dá seu canto, luz, perfume,
Crença e amor;
Pois se tudo sobre a terra
Que ame alguem,
Rosa ou espinho, quanto encerra
Dá, se o tem;
Se os carvalhos, nus, medonhos,
Veste abril;
Se inda a noite presta aos sonhos
Graças mil;
Se onde ha ramo, voz uma ave
Desprendeu;
Se onde ha folha, gotta suave
Cahe do céo;
Se na praia, quando a onda
Vem de lá,
Beijos, antes que se esconda,
Mil lhe dá;
Tambem, anjo meu saudoso!
Te hei de emfim
Ah! dar quanto de precioso
Sinto em mim!
Dou-te o nectar, que me acalma;
Toma-o tu!
Sim, meu pranto; mais uma alma
Que eu possuo!
Dou-te os sonhos meus ardentes,
Mas leaes;
Dou-te as notas mais cadentes
Dos meus ais!
Do que ha lindo, tudo quanto
Me seduz;
D’esta vida, riso e pranto,
Noite e luz!
Dou-te o genio meu, que á sorte
Vês fluctuar
Sem mais véla, sem mais norte
Que esse olhar!
Dou-te a lyra, que me inspiras,
Sonho meu!
Que suspira, se suspira,
Flôr do céo!
Dou-te; aceita: tudo é santo,
Tudo, flôr!
Dou-te uma alma toda encanto,
Toda amor!
V. Hugo.
Coimbra.
FLÔR E BORBOLETA
Tu vôas, borboleta! e que eu não possa
Voar, amor!
Diversa como é n’isto sorte nossa!
Dizia a flôr.
No valle, ambas irmãs, nascidas fomos;
És como eu sou;
E amamo-nos, e flôres ambas somos,
Mas eu não vôo.
A ti leva-te o ar; prende-me a terra
A mim; e eu
Como hei-de perfumar-te em valle e serra,
E lá no céo!…
Mais longe inda tu vás, por outras flôres…
Girar, talvez,
Em quanto a minha sombra, meus amores!
Gira a meus pés!
E vens-me vêr depois, mas vaes-te embora,
Sabendo, assim,
Que em lagrimas me encontra sempre a aurora!
Pobre de mim!
Acabem-se estas mágoas, meu thesoiro
E meu amor!
Cria raiz ou dá-me as azas de oiro,
Celeste flôr!
V. Hugo.
Coimbra.
REMOINHO
Olha como embrulhado
Que está ainda o céo
E o chão, como ensopado
Da agua que choveu…
Foi um diluvio d’agua;
E o furacão, que fez,
Emilia! até dá mágoa
Tantos estragos: vês?
Esta infeliz víuva,
Foi-lhe o telhado ao ar;
Depois, já nem da chuva
Tinha onde se abrigar.
De mais a mais sósinha,
Sem ter nenhum dos seus
Aqui ao pé; ceguinha…
Bemdito seja Deus!
Além n’aquelle serro
Parece que raspou
Com uma pá de ferro
A terra que encontrou.
Nem um só pé de trigo
És lá capaz de vêr.
Já eu disse commigo:
Como póde isto ser?
As arvores arranca
O vento muito bem;
Serve-lhe de alavanca
A rama que ellas tem.
Vem de lá elle e, topa
N’uma arvore, o que faz?
Enrola-se na copa
E, tronco e tudo, zás!
Que as folhas não são nada,
Uma por uma, não;
Mas já uma pernada…
Tão poucas ellas são?
Vê lá se o teu cabello
É para comparar;
Mas, possa alguem sustel-o,
Levanta-te no ar.
Aqui um loureirinho,
Que era o que havia só,
Encontra-o no caminho,
Ia-o fazendo em pó.
D’aqui passa, á maneira
Assim d’um caracol,
Áquella farrobeira
Põe-lhe a raiz ao sol.
Aquelle enorme tronco
Quiz resistir, depois,
Ouviu-se um grande ronco,
Quando o eu vejo em dois.
Andava a rama toda,
Emilia! assim, vês tu?
Á roda, á roda, á roda,
Eis senão quando, rhuh!
Foi quando veio o outro
Urrando como um boi,
Oh que horroroso encontro!
Então é que ella foi.
Vês uma cobra enorme
Á calma, quando está
Grande calor, conforme
As tenho visto já?
Que não tem ar avonde,
Falta-lhe já o ar,
Quer sangue ou agua onde
Se possa refrescar;
Anceia-se, sacode
O corpo todo a vêr
Se vôa, mas não póde;
Voar não póde ser;
E como não supporta
Já o calor do chão,
Ao vêr-se quasi morta
De raiva e afflicção,
Apenas finca a ponta
Do rabo em terra, e sái;
E faça-se de conta
Que é a voar que vai
N’aquellas roscas todas
Que, olhando-se-lhes bem,
São outras tantas rodas
Em cima d’onde vem;
N’aquelle parafuso
– Aquelle rodopio,
Á roda como um fuso
Suspenso pelo fio;
Com a cabeça chata,
Aquelle olhar feroz,
Aquelle olhar que mata
Sempre de fito em nós?
Assim d’essa maneira
É que elle vinha, o tal;
Salta-lhe á dianteira
Este de força igual;
E assim que se avistaram,
Não sei o que lhes dá;
Ficam suspensos, param,
Como com medo já;
Aquelles sorvedouros,
Em vez de remoinhar,
Parecem-se dois touros
Jogando a terra ao ar;
Ouvia-se a oliveira
Zunir no ar, então,
D’um para o outro inteira,
Nem bala de canhão;
E assim se vão chegando
Cada vez mais, até
Que eu ólho, eis senão quando
Vejo… mas vejo o que?
. . . . . . . . . . . . . . .
Messines.
AMORES, AMORES…
Não sou eu tão tola
Que cáia em casar;
Mulher não é rola,
Que tenha um só par:
Eu tenho um moreno,
Tenho um de outra côr,
Tenho um mais pequeno,
Tenho outro maior.
Que mal faz um beijo,
Se apenas o dou
Desfaz-se-me o pejo,
E o gosto ficou?
Um d’elles por graça
Deu-me um, e depois,
Gostei da chalaça,
Paguei-lhe com dois.
Abraços, abraços
Que mal nos farão?
Se Deus me deu braços,
Foi essa a razão.
Um dia que o alto
Me vinha abraçar,
Fiquei-lhe d’um salto
Suspensa no ar.
Amores, amores.
Deixál-os dizer;
Se Deus me deu flôres,
Foi para as colher.
Eu tenho um moreno,
Tenho um de outra côr,
Tenho um mais pequeno,
Tenho outro maior.
FABULA
Um dia os deuses, cada qual uma arvore,
Á sua guarda consagraram: Jupiter
Esse o carvalho, a murta Venus, Hercules
Lá esse o alemo, e o loureiro Apollo.
Vendo-as Minerva todas infructiferas:
Que é isto? exclama. Jupiter acode-lhe:
Senão, diriam, filha! que as guardavamos
Só pelo fructo.– Que me importa digam-no;
É pelo fructo que a oliveira escolho.
Minerva! brada o pai d’homens e deuses,
És quem, de todos, sabes mais sem duvida;
No que não luza… mal fundada gloria.
Honra sem proveito
Faz mal ao peito.
Phedro.
Coimbra.
BOAS NOITES
Estava uma lavadeira
A lavar n’uma ribeira,
Quando chega um caçador.
– Boas tardes, lavadeira!
– Boas tardes, caçador!
– Sumiu-se-me a perdigueira
Alli n’aquella ladeira,
Não me fazeis o favor
De me dizer se a bréjeira
Passou aqui a ribeira?
– Olhai que d’essa maneira
Até um dia, senhor,
Perdereis a caçadeira,
Que ainda é perda maior.
– Que me importa, lavadeira!
Aqui na minha algibeira
Trago dobrado valor.
Assim eu fôra senhor
De levar a vida inteira
Só a vêr o meu amor
Lavar roupa na ribeira…
– Talvez que fosse melhor,
Vêr… coser a costureira!
Vir, de ladeira em ladeira,
Apanhar esta canceira
E tudo só por amor
De vêr uma lavadeira
Lavar roupa na ribeira…
É escusado, senhor!
– Boas noites… lavadeira!
– Boas noites, caçador!..
Messines.
GASPAR
Ora se não sei eu quem foi teu pai!
Fidalgo: sei perfeitamente bem.
O que eu não sei, Gaspar! é o que vem
N’esta vida fazer quem já lá vai.
Já se vê que é aos paes que a gente sái.
Tal pai, tal filho; sim, duvída alguem
Que um pai se é como o teu, homem de bem,
Tu és homem de bem como teu pai?
D’isto não ha quem possa duvidar.
Mas queres um conselho que eu te dou?
Não mexas n’isso… cala-te, Gaspar!
Que eu, cá por mim, bem sabes como eu sou,
Mas é que outro talvez mande tirar
Certidão de baptismo a teu avô.
Coimbra.
* * *
Deixa que ao romper d’alva o cravo abrindo,
Á rosa envie o aroma;
E lá quando alta noite a lua assoma,
O rouxinol carpindo!
Que pela face a lagrima resvale
De quem no exilio geme;
E quando a propria sombra o homem teme,
Que a mãi seu filho embale.
Deixa que ao espaço immenso os olhos lance
O sol antes que expire;
Que pelo norte a bussola suspire
E nelle só descance.
Amam leões e tigres. Não ha nada,
Anjo! que a amor se esconda.
Beija a pomba o seu par; e abraça a onda
A rocha inanimada.
Deixa que a nuvem negra tolde a lua
Se a leva a tempestade;
Deixa que eu te ame a ti, cara metade,
D’esta alma toda tua!
Coimbra.
CARTA
Maria! vêr-te á porta a fazer meia,
Olhando para mim de vez em quando,
É o que n’esta vida me recreia.
Acordo até de noite suspirando
Por que rompa a manhã e tenha o gosto
De te vêr já tão cedo trabalhando.
Desde pela manhã até sol-posto
Que não tens de descanço um só momento;
Por isso tens tão bella côr de rosto.
E eu pallido, Maria! O pensamento
Não é trabalho que nos dê saude,
Esta imaginação é um tormento.
Que bello tempo aquelle em quanto pude
Levar, como tu levas, todo o dia
N’essa vida chamada ingrata e rude!
Nunca soube o que foi melancolia,
Nunca provei as lagrimas salgadas
Com que a nossa alma as penas allivia;
Andava sim por essas cumiadas
Ao sol, á chuva, muita vez, sósinho,
Vendo os valles, das rochas escarpadas;
Descendo pelo córrego estreitinho,
De pontal em pontal, cortando o matto,
Pelas chapadas, fóra de caminho;
Mas não era que já o teu retrato
Me andasse a mim no coração impresso,
Onde hoje o trago no maior recato,
E um desengano teu que não mereço
Me tivesse tirado a fé tão dôce
D’alcançar algum dia o que appeteço.
Não foi, não, a paixão que assim me trouxe
Tão erradio a mim, digo a verdade
E nem eu te negava se assim fosse.
É que a gente na sua mocidade
Não cabe em si, não pára de contente,
E assim fui eu na flôr da minha idade.
Tu eras n’esse tempo simplesmente
A flôr que vai nascendo e mais valia
Seres tão tenra ainda e innocente.
Já esse lindo pé que tens, Maria!
Esse quadril tão largo, e cinta estreita,
Me não vinha á idéa noite e dia;
Esses encontros de mulher perfeita,
Esse peito redondo e arqueado
Como o de pomba farta e satisfeita.
Talvez vivesse então mais socegado,
Ou já que minha sorte é sempre triste
Ao menos não andasse enfeitiçado.
Esse bello pescoço, não existe
Outro assim torneado: o rosto é lindo
E a tão meiga expressão ninguem resiste.
A bocca é tão vermelha que, em te rindo,
Lembra-me uma romã aberta ao meio
Quando já de madura está cahindo.
Esses olhos azues… que olhar! Receio
E desejo estar sempre a contemplal-o;
Não ha mais dôce e mais custoso enleio:
Eu não oiço fallar então, nem fallo
De enlevado que estou e, juntamente,
Gemendo e abafando os ais que exhalo.
Oh nuvem da manhã resplandecente,
Manto real de sêda delicada,
Cada fio um grilhão que prende a gente.
Bem podias, Maria! andar tapada
Só com o teu cabello, á semelhança
Do sol em nuvem de manhã doirada.
É tudo encantador. A gente cança,
Cança de estar olhando e sempre vendo
Um novo encanto a cada olhar que lança.
E se essa linda voz nos sái dizendo
As mimosas palavras que costuma,
Sente-se a gente logo derretendo;
Que além d’um rosto tão perfeito, em summa
Coube-te em sorte um coração perfeito
E em ti não ha, Maria! falta alguma.
Oh que ditoso, alegre e satisfeito
Não viverá o homem que algum dia
Sentir pular-te o coração no peito,
E que em deliciosissima agonia,
Vendo-te já os olhos desmaiando
Como desmaia o céo á luz do dia,
Nas azas da ventura atravessando
Os espaços d’um extasi ineffavel
Abraçado comtigo fôr voando
Lá para onde tudo é bello e estavel!
Messines.
Türler ve etiketler
Yaş sınırı:
12+Litres'teki yayın tarihi:
24 ağustos 2016Hacim:
80 s. 1 illüstrasyonTelif hakkı:
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